quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O VELHO CINEMA (*)


De tudo o que me lembro esse tudo me deixa em êxtase.

A cidade era pequena, de ruas poeirentas, molecada na rua, carroças e cavalos subindo pela avenida transportando gente e carga. O velho cinema ficava numa rua transversal à avenida. De tudo o que me lembro, lembro que esse cinema sempre foi velho. Para mim, ele era um elemento da natureza, houvera nascido junto com o mundo, antes mesmo da pequena cidade. Para mim e o restante dos guris o velho cinema exercia sobre nossa imaginação um fascínio indescritível. Era o palácio onde residia a magia, a aventura, a alegria. Sonhávamos todos com as canções de cinema, aquelas músicas italianas para lá de românticas que nos preparava os espíritos para a sessão que viria. E, como relatar o lento apagar das luzes, as emoções que pulavam dos nossos peitos e eram extravasadas pelas nossas gargantas em grandes e largos gritos de “Vivas!” “Vivas!” “Vivas!”, e dê-lhe assovios, olhos arregalados, braços erguidos, pipocas para o alto. Quando finalmente as luzes se apagavam por completo, o silêncio reinava no velho cinema, todos queriam ver os gols do Canal 100 e se extasiarem com os trailers nas novas epopéias que encheriam nossos corações de ação nas semanas seguintes.

Não havia muita escolha, geralmente era um bang-bang, Trinity, Giuliano Gemma em um faroeste espaguete italiano; víamos muito Tarzan, era o preferido da gurizada e também Mazzaropi, este sempre era campeão nas bilheterias; na sexta-feira santa, entrava ano e saia ano víamos “A Paixão de Cristo” e o piso do cinema ficava escorregadio com as lágrimas das beatas e da gurizada.

Outro grande barato era ficar durante a semana vendo os pôsteres dos filmes que seriam passados nas sessões noturnas. Vinha o grande pôster no centro, e, ao lado, pequenos fragmentos do filme; através destes estilhaços em retratos branco e preto a gente imaginava a estória toda e passávamos horas discutindo sobre mocinhos e bandidos.

De tudo o que me lembro esse tudo me deixa em êxtase... E me faz sentir uma saudade danada do velho cinema, dos tempos em que as famílias iam de mãos dadas para dentro desses palácios da sétima arte ver a telona juntos e depois, saírem para bater papo nas praças ou tomar alguma coisa no boteco da esquina.

Pelo que sei, o velho cinema ainda resiste em pé, lá na pequena cidade, ainda que acabado, não funciona mais como cinema e, provavelmente, está aposentado para toda e qualquer coisa. Mas eu o levo comigo, no coração, e para mim, nunca haverá outro como ele – cadeiras desconfortáveis, acústica sofrível, pipoca fria, um calor de dar inveja a uma fornalha, mas foi diante de todas essas adversidades que aprendi a amar a sétima arte e ela ajudou-me a construir como sou.

De tudo o que lembro me leva a lembrar com maior tristeza: tenho saudades do velho cinema...



(*) Dedicada ao velho cinema de Paraná d’Oeste/PR, na foto.

3 comentários:

Anônimo disse...

Como é bom recordar bons momentos não é mesmo?!
Bjs.

Cris França disse...

Fez nos viajar contigo pelo bons tempos e reviver algumas memórias de cinema que para mim são inesquecível como a eterna musica do Canal 100. Parabéns pelo tema, paixão que temos em comum. abraços mon ami!

Gorete . SoLua disse...

E quantos velhos cinemas há por aí que somente estão nas lembranças. Não importa como ele era.
Era o palácio onde residia a magia, a aventura, a alegria. :)

Doces beijos