A noite da cadeia é tão
frágil.
É um fino cristal que, no
primeiro e no mais leve toque, quebra-se em mil pedaços, cada um desses
estilhaços produzindo o som rígido de um trovão.
Mil trovões
enclausurados...
A madrugada estende sua
negra colcha felpuda e o silêncio parece deitar-se sobre ela, reconfortando-se
nesse aconchego.
De repente, se ouve um
grito, uma voz que uiva para a lua seu lamento. Triste lamento...
Se prestares atenção,
ouvirás a sinfonia de grilos, minúsculas sirenes num universo que odeia
sirenes.
Uma coruja dá um bote... e
erra. Na cadeia também se erra os botes, só que nesse lugar os fracassos fazem
as barrigas dormirem vazias. Cadeia sempre cobra, sempre cobra.
Uma lâmpada acesa se
apaga, acende, apaga, acende, numa eterna dúvida consigo mesmo – lâmpadas
acesas são lâmpadas; lâmpadas apagadas é apenas noite, é treva, é escuridão,
não brilha, não é nada.
Noite, é isso o que somos
todos nesse lugar... noite.
O ladrão
ama a treva porque nela não é visto, e o agente penitenciário é apenas noite,
gostando ou não gostando, noite, simples assim. Sem explicações, sem nada.
Treva. Não é nada além disso... Ninguém quer mesmo vê-lo... Melhor esquecê-lo
dentro da noite da cadeia.
Onde o agente
penitenciário pisa não floresce esperanças.
Não nos enxergam como
polícia. Não somos polícia.
Não somos sequer segurança
pública, somos um embaraço, um estorvo, uma necessidade incômoda.
Somos o silêncio da
cadeia, frágil, que se quebra em mil pedaços. Somos cadeados fechados, portas
trancadas. Somos lâmpadas que para a sociedade, para os governantes, não
acendem.
Lâmpada que não se acende
é apenas noite.
Somos a treva e na treva
permanecemos mergulhados.
As noites na cadeia são
tão frágeis... tão frágeis...
E o grito, o grito e seu
lamento dentro da noite?
Descubro quase sem querer,
o dono do grito, a aflição dentro dele. Não era um lobo, não era um bicho, não
era ladrão que gritava.
O dono do grito era eu...
era eu... um agente penitenciário!