quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

A CEIA SANTA



Vamos irmãos, todos irmãos meus!
Nosso coração queima de vontade,
Vamos adorar ao Pai, nosso Deus,
Em espírito e em verdade!


Enfeitemos a mesa, nosso altar.
Pão e vinho, alimento para o espírito.
Da cruz e Cristo, vamos nos lembrar,
A Santa Ceia é muito maior que um rito.


Se somos o que somos, remidos.
Não foi por mérito teu, sequer meu,
Éramos mais um na multidão de perdidos!


Oh, obrigado Deus, pelo filho Seu!
Enquanto subiam-no no madeiro crucificado,
Meu pecado descia da cruz purificado!

sábado, 8 de dezembro de 2018

LOBO NA SOLITÁRIA



Fato.
Todo ser que acabou trancafiado na cadeia é um ser auto destrutivo.
É alguém que possui nítidos problemas de personalidade, desconhece hierarquias e ordenamentos e, acima de tudo, não tem qualquer escrúpulo em quebrar leis e regras.
Leis e regras são fundamentais na vida em sociedade, são elas que estabelecem as fronteiras na convivência humana, a perfeita harmonia entre os homens.
Se não houver regras, não haverá ordem.
Dentro da cadeia existem uma espécie sui generis de preso que consegue ser ainda mais auto destrutivo que os demais. Porque a cadeia, entenda-se, possui um ordenamento próprio que é natural dela e que todo preso procura seguir, não por satisfação, sim por entender que a quebra das regras na clausura, automaticamente gera uma punição: crime e castigo.
Especificamente esse preso que iremos tratar agora, andou por toda a cadeia, incomodando e desrespeitando as leis naturais de cada pavilhão – tudo o que conseguiu construir dentro da prisão foi ser um “seguro”, ou seja, preso que não tem mais convivência com o restante da população carcerária.
Foi parar na disciplina, na solitária estacionou. Não tinha para onde ir...
Os dias viraram meses e, por sua única vontade, ficava ali.
Ocorre que um dia qualquer começou a conversar com internos do pavilhão ao lado, até aquele dia tinha fechado os ouvidos para todos e tudo, por um motivo qualquer (desconhecido), começou a flertar com o raio vizinho.
Um preso gritava do “prédio”, ele respondia da “forte”.
Estabeleceu-se um namoro.
Os presos do pavilhão convidaram-no para retornar: “Foi tudo esquecido...”, “Tá tudo ajeitado...”, “Chega de sofrimento, irmão!”.
Ele concordou.
Confiou e pediu para voltar.
Falou com a segurança penitenciária expondo sua decisão.
Os agentes aconselharam que não, que aguardasse uma transferência, poderia ser nada, poderia ser tudo, poderia ser uma armadilha.
Não teve jeito, a sua confiança tinha atingido o pico e no alto dessa montanha ficou cego para seu passado de pecados e desrespeitos dentro da cadeia.
E, convenhamos, a mudança de cela era seu direito.
Assinou os papéis que permitiam sob sua responsabilidade o retorno e caiu para dentro do pavilhão. Sorridente.
No último instante, quando o agente já se preparava para fechar a porta da cela, teve um insight, convidou o preso que entrava para sair, para voltar atrás e desistir dessa mudança.
“Que é isso, senhor?” Ele respondeu já com alguma arrogância. “Tô de boa... Tô com a família...” Respondeu confiante.
“Isso mesmo, senhor! Ele está com a família...” Falaram os demais internos enquanto o faziam desaparecer para dentro da cela envolto por uma avalanche de abraços e tapinhas nas costas.
Nada mais a fazer.
O agente bateu a porta e se foi para cuidar da rotina da cadeia. A megera não para e, ali, parecia tudo bem.
No outro dia, o preso amanheceu pendurado.
Havia se “suicidado” dentro da madrugada.
Cadeia cobra, sempre cobra.

Todo ser que busca a própria destruição, um dia a encontra.
Fato

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

A PRATELEIRA DAS HORAS



Durante uma cinza hora
De uma prateleira de uma tarde,
Tarde dessas tão igual
Quanto todas as demais tardes
De um quente e monótono verão.
Uma brisa tocou minha face,
Tão delicadamente
Que me extasiou todo
Ao seu toque frugal.
Foi muito mais que uma brisa.
Foi uma sugestão de você.
Em um estalo,
Tão repentino
Quanto poderoso
Voce nasceu em meu pensamento.
Escorregastes para dentro de mim
Em uma cascata de sentimento,
Senti sua presença em mim.
Toda você em tudo em mim.
Momento exuberante.
Olhei para a tarde,
Já não mais tão cinza.
Separei a mais bela
Prateleira de hora,
Doirada,
Ornamentada com flores,
E, ali te coloquei.
O momento já não era mais momento.
A hora já não mais era hora.
Pequenos se tornaram...
Saltastes da prateleira da hora
E voastes para dentro da eternidade.

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

APARÊNCIAS NÃO ENGANAM...




Entrou dentro do pavilhão cheio de esperanças.
Notava-se isso no sorriso muito jovem, nas atitudes esperançosas de folgar um bocado as agruras que a velha megera despejava encima dele – cadeia não é para fracos.
Tudo parecia normal, corriqueiro mesmo, quando o play da quimera foi acionado. Se existe uma verdade dentro da cadeia é que não existe off, segredos incham dentro das entranhas do monstro e acabam eclodindo em miasmas fétidos.
Foi o que aconteceu com o jovem.
Quando entrou no novo pavilhão, cheio de sorrisos e expectativas, não imaginava que sua “capivara” estava sendo puxada pelos ninjas do “voz”.
Ele foi rodeado por amabilidades protocolares, sorrisos e apertos de mãos pipocavam de diversos lados e ele se sentiu acolhido, aceito.
De repente, alguém encosta na liderança do pavilhão e derruba toda a ficha do jovem. Jogou com o adversário, decretava os bochichos.
Como uma tarde de sol que de repente é colhida pelas negras nuvens da tempestade, assim o tempo se fechou sobre a vida do menino.
Sorrisos se transformaram em carrancas; vozes macias em trovões, apertos de mão em safanões e bofetões, a vida é dinâmica dentro da cadeia, nada é o que parece ser e o que parece ser não é de verdade. O diabo é o pai da mentira e a casa dela neste mundo é a penitenciária.
O menino tentou se defender de todas as formas, mas como se defender de uma avalanche?
A coisa não foi pior porque um agente penitenciário atento, fechou o garoto no “brete de segurança” e o retirou para fora do pavilhão.
Ele chorava.
Alegava inocência de pertencer a quem não devia pertencer.
Como saber a verdade? Era ou não era? Para a megera isso não importa, o reino dos cadeados trabalha com o que parece ser verdade, mais fácil, mais rápido, sem maiores custos.
Fora do pavilhão o garoto chorava.
Sabia que sua vida estava difícil, mas, a partir daquele momento, estava ainda pior. Portas haviam sido fechadas, porta fechada por dentro na cadeia não abre de jeito nenhum, regra do lugar.
Ele subiu, derramando lágrimas jovens na grande artéria da quimera.
O agente ficou olhando, um lamento em seu olhar, uma dor escondida no coração – mais uma vida desperdiçada no reino dos cadeados.
Ele sumiu tragado pelo fechar feroz de um portão que trancava para ele todas as esperanças...