segunda-feira, 29 de setembro de 2008

HOMENAGEM AOS ESCRITORES


Em 9 de julho transato, eu e meus colegas (acima na foto) fomos homenageados no desfile de aniversário da cidade de Fátima do Sul/MS. Bacana, não!!! É sempre bom receber o reconhecimento público por algo que você fez! Parabenizo meus amigos pelas suas obras e por serem obstinados guerreiros em defesa da leitura! Eu, por minha parte, continuo meu caminho amando as letras em todas as suas formas: lendo-as e escrevendo-as!!! Fazer o que, amores são amores, e quando eles são verdadeiros, são para a vida toda!

domingo, 21 de setembro de 2008

Um Homem de Fé


Chegou cedo, como sempre.
Ao abrir a porta, o ar mofo da inatividade veio lhe cumprimentar as narinas. Ligou as muitas luzes e expulsou a escuridão. Sobre o altar, acendeu um par de velas, persignou-se e ajoelhado começou a ditar meia dúzia de orações ao padroeiro. Terminado o momento de fé pegou um velho pano que estava a um canto e começou a tirar a poeira. Fazia isso com alegria, porém, algo resignado ou cansado dos muitos anos de dedicação solitária e ininterrupta.
Abriu enfim a igreja. As grandes e largas portas rangeram ao se esfregarem no piso duro.
Já no altar, puxou do bolso os velhos óculos e começou a folhear a Bíblia. Escolheu uma passagem, a sua favorita, olhou o relógio, os bancos.... muito tarde, vazio novamente.
Triste, entrou na sacristia e pegou um desgastado livro de cânticos amarelado pelo tempo.
Voltou ao salão principal, nos bancos da frente, três devotas anciãs, antigas companheiras de rezas e penitências faziam-se presentes, como sempre. E como sempre.... as únicas. Olhou-as brevemente, cumprimentou-as e deu inicio ao culto tão pobre em espectadores.
Seguiram-se então os cânticos entremeados de Credos e Terços. Feitos os louvores e algumas orações, pediu as companheiras que abrissem suas Bíblias numa passagem previamente escolhida. Leu-a em voz alta e depois discorreu sobre o tema proposto pela Leitura. As devotas o ouviam atentamente, óculos nas faces, rosários nas mãos.
Terminado a explicação do Evangelho, fecha sua Bíblia sobre o Altar, pega seu velho rosário e sentando-se ao lado das companheiras inicia um novo terço. Segue-se mais meia hora de Aves Marias e Pais-nossos.... Rezam como se o fizessem pela última vez. Para eles, sabem eles, o tempo é escasso, curto. A vida é urgente. Deve-se sempre estar em paz.... consigo, com o Criador....
Depois de mais alguns louvores, dão por encerrado o culto dominical noturno. Despedem-se e partem. Ele continua por ali, mais algum tempo. Cuida de alguns papéis, apaga todas as luzes, faz uma última oração e satisfeito consigo próprio segue o seu caminho para casa. Nunca chega. Um enfarto mortal o estende pelo caminho.
No mesmo instante, dentro da igreja, uma brisa repentina abre a Bíblia sobre o Altar e a faz folhear-se parando em uma passagem específica, a mais lida naquela pequena igreja.
Encontram-no horas depois... Os olhos pregados no céu de estrelas, os braços abertos em cruz, nos lábios um sorriso feliz.... descansava em paz!!!

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Fragmentos do Diário NUNCA escrito por mim


Por um motivo qualquer sentiu pena
dos malditos e miseráveis.

Que algo terrivel é esta compaixão...

Os malditos e miseráveis eram homens!!!

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

ENQUANTO A LIBERDADE NÃO ALVORECE...


... A madrugada chega e encontra-me atento
Para todas as expectativas,
Para todos os estímulos da noite na cadeia.
O rádio da polícia que ruge.
O tétrico ulular da coruja caçadora.
O morcego que sibila em seu vôo cego.
O ruflar de asas do inseto bizarro.
O rato que se acomoda em sua toca de sucata.
A rodovia, lá fora, lá longe, que nunca dorme.
A suave queda do orvalho na relva.
O ladrão que grita dançando com a droga.
A faca que se esconde, sempre pronta para perfurar
o tênue hímen da vida.
Um sonho que se desprende num suspiro profundo.
O pensamento suicida que reflete o desespero
de vidas estéreis.
O cadeado trancado.
A porta trancada.
A liberdade expulsa.
A noite é mais dolorida na cadeia.
O dia sufoca, ilude a tristeza.
A noite a traz para fora...
Quando a madrugada chega na cadeia,
Encontra todos os sonhos trancados,
E a esperança perdida num sonho que não se cumpre
Jamais em noites na cadeia.
A liberdade é clara, todos sabem, clara como a luz do sol!

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

UMA BEBIDA AO OCASO


Chegava sempre aos finais das tardes, à sombra do crepúsculo. Entrava, tirava seu velho e inseparável chapéu, colocava-o a um lado do balcão, sentava-se sobre um banco e pedia uma bebida gelada. Servia-o e ele sorvia-se de um gole; o primeiro, sempre rapidamente, como se sua vida dependesse disso e deixava escapar uma feição de intenso prazer. Feito este pequeno ritual ia bebendo devagar, prazerosamente, o olhar distante, o pensamento distante, a concentração distante. Seu silêncio era pesado, nada parecia importuná-lo naquele seu instante, era como se recompensasse a si próprio pelo dia de trabalho, pela vida de trabalho, dando-se uma bebida gelada e solitária, sempre aos finais das tardes.
Algumas vezes, raras vezes, puxava uma conversa. Isso era muito eventual e, quando acontecia, trazia do baú da memória um velho causo, uma lembrança antiga surgida num relâmpago, originada de um fato qualquer despercebido que o tocava e resgatava a reminiscência. Nesses momentos, falava olhando para o copo, para a garrafa suada sobre o balcão. Contudo, percebia-se seu olhar além do copo, além da garrafa. Parecia estar em outro lugar, talvez outra dimensão, onde buscava os fatos até então esquecidos, um lugar onde suas histórias não morriam e que, no momento, reviviam em suas palavras ganhando formas novamente.
Ele não gostava de ser interrompido, e eu sabia disso. Mantinha, por minha vez, um silêncio solene e compenetrado e ouvia-o. Jamais poderia dizer ser esta uma tarefa cansativa. Para nós: para mim, para ele, era um hábito extremamente arraigado. Fazia parte da gente, como fazíamos parte dele (do momento). Ouvia-o então, como se ouvisse um pai, um mestre. Jamais poderia considerar fadigosas suas palavras emotivas, suas histórias introspectivas, suas buscas por outros caminhos que poderia ter tomado na sua vida. Nas raras vezes em que quebrava seu silêncio; sua fala era-me como uma lição, e em devoção, ouvia-o.
Quando terminava o conteúdo da garrafa; terminava o seu ritual, nosso ritual. Pagava a bebida, tomava nas mãos o velho chapéu e o ajeitava na cabeça. Agradecia numa breve palavra ou com um gesto, um aceno, e partia de maneira tão lenta e resoluta quanto chegara. Para ele, havia-se decretado o fim de seu dia. Nada mais a fazer. Nada mais a dizer. Somente descansar no aguardo de um novo dia que nascesse em sua vida; até o dia, derradeiro dia em que nada mais lhe restasse a fazer.... Que senão.... Fechar os olhos e calar todas as histórias e esquecer todas as garrafas fechadas....