segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Por um punhado de reais

 

Algumas vezes assisti a queda de um deles.

Não falo destas quedas heroicas em campos de batalhas, onde se vai um corpo ao chão e se eleva um nome ao Olimpo dos heróis da Policia Penal.

Falo dessas pérfidas quedas onde o tropeço acontece na superfície do cotidiano e o tombo se dá no subterrâneo sombrio da corrupção.

Tenham absoluta certeza de que ninguém odeia mais a corrupção do que o Policial Penal. Absolutamente, ninguém!

Ela atenta contra ele, fala contra ele, o acusa em toda a sua essência e dignidade que, arduamente ele luta para conquistar, tudo é difícil para o Policial Penal, tudo.

Quando um deles se corrompe é o atraso, é o fracasso, é atirar lama na vocação policial, é blasfemar contra toda a categoria, um anão tolo entre gigantes.

Quando se revelam (e sempre se revelam, cadeia não tem off) o primeiro sentimento dos colegas é a surpresa que é logo substituído por uma raiva genuína. Tanto se trabalha, tanto se doa para se construir um bom nome da Polícia Penal e, de repente, um único sujeito destrói anos de trabalho duro de toda a centena de valentes.

Ainda me lembro do último que caiu...

Confesso que não foi tão surpresa assim... Outros doeram mais que este.

Ainda assim, foi bastante sofrido, sempre é, é como se martirizar por conta própria, cortar na própria carne.

Um dia estávamos todos lá a lutar dentro da quimera pela justiça e pela ordem, no outro, caçávamos um companheiro como se caça um ladrão, porque, no final de todas as contas, por mais que elas sejam refeitas, ele escolheu se tornar um... um deles... renegando a sua própria raça.

De repente, num dia que parecia muito comum, uma nuvem negra se estabelece sobre o sol cotidiano do trabalho penitenciário, tudo fica treva, tudo fica sombrio, então, escuta-se um baque surdo e violento, um som aterrador de algo que se cai no adiposo chão da quimera.

É um objeto? Não!

É um corpo? Não!

Todos olham para o chão e veem, a se espernear, estrebuchando no chão com uma ferida mortal no peito a honra de um colega que se deixou seduzir pelo demoníaco lado negro.

Então passa-se a surpresa...

Vai-se embora a raiva e o ódio...

E quem nos abraça é uma megera de boca fétida e dentes excessivamente amarelos, uma velha chamada decepção.

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

DISCURSO IMPERFEITO SOBRE A PERFEIÇÃO

 Perfeição?

Onde reside a perfeição?

Quem a concebeu?

Onde pode ser encontrada?

Sou um apaixonado por ela,

A busco como quem busca

O alimento,

Por tantas noites quis abraçar

O seu corpo e me manter

Aquecido e esquecido

Nesse abraço perfeito.

Perfeição?

Depois de tantos anos

Aprendi que jamais a encontrarei.

Aqui...

Ela não vive neste mundo,

Mundo imperfeito

De imperfeitas criaturas.

A perfeição visitou esse mundo

Uma única vez,

E quando chegou,

Trazendo o amor

Em forma de sacrifício e perdão,

Foi pregada no madeiro,

(Este mundo não conhece a perfeição.)

Então ela retornou para o seu lugar

E é lá que eu irei a encontrar...

Um dia...

Um dia...

Enquanto isso vivo a buscar

Arremedos de perfeição,

E por tanto ama-la e busca-la

Encontrei um dia seu sorriso

Encontrei seu abraço,

Encontrei a sua vida que

Se misturou a minha

E juntas, a minha e a tua,

Criamos algo próximo da perfeição.

Sim, com falhas, erros e carências,

Mas dentro do que falta,

Aprendemos a olhar o que sobeja,

Nosso amor

E a vontade de estarmos juntos,

E isso nos leva para próximo da perfeição.

Te amo dentro de nosso mundo imperfeito

E quanto mais aprendo a te amar,

Mais próximo fico do perfeito!

segunda-feira, 11 de julho de 2022

 


À SUA BENÇÃO, MAMÃE!

 

A pequena senhora já carregada de janeiros adentrou o raio com enorme expectativa, era nítido isso em todo o seu corpo.

Do meio da turba que estava dentro do pavilhão, um corpo sobressaiu algo agitado e foi de encontro a senhora que entrava.

Pararam frente ao outro.

Olharam-se fixamente.

Corações batendo forte como se tambores soassem em meio a balbúrdia do pavilhão.

Ele estendeu sua mão magra para ela – pediu a benção.

Ela estendeu sua mão magra para ele – deu-lhe a benção.

Tudo isso durou um instante mas foi acompanhada por dezenas de olhares bisbilhoteiros, ele nunca havia recebido visita antes, a massa carcerária estava curiosa.

Muitos dos que ali estavam nunca haviam testemunhado aquela cena antes – um filho pedir a benção a uma mãe – muitos sequer conheciam o que era benção, muitos sequer conheciam o que era mãe, assim, tudo era estranho e tinha gosto de primeira vez, um gosto ácido para não dizer azedo.

Alguém que já havia visto a cena e realizado o ato, sentiu na boca um gosto de saudades – lembrou-se da mãe que já partira e segurou com força uma lágrima que brotou do seio dessa lembrança e queria jorrar feito cascata ali em meio a bandidagem. Corações duros evitam emoções...

Outro, ficou com vontade de ser abençoado, porque se deixou levar por caminhos que sugeriam materialismos e futilidades.

Mas a velha mãe estava esquecida de todas essas coisas, toda a sua atenção se voltava para o filho bandido.

Simplesmente o abençoou, com todas as forças de seu corpo e sua alma, abençoou-o como se o fizesse a um santo, como se fosse a última coisa que iria realizar, como se a benção fosse regenerar o filho ladrão, como se ela pudesse tira-los dali e lança-los em voo para um lugar que fosse somente deles. Mãe é sempre mãe, mesmo aquelas que são mães de bandidos.

A verdade é que ela entregou tudo naquela benção, seu entusiasmo, sua energia, principalmente sua fé. Uma fé que a fazia sonhar que pela benção ela conseguiria transformar as ideias e os apetites do filho, consequentemente, sua vida e sua realidade, porque há muito tempo atrás ela havia entendido que sem Deus, no filho nada se regeneraria.

Ela entregou tudo naquela benção porque para ela e somente para ela, naquele lugar e em toda a parte, não era um ladrão que ela abençoava era seu filho.

E um abraço os uniram em frente a turba emocionada.

 

 

segunda-feira, 16 de maio de 2022

O PORTEIRO DA IGREJA


 Quando passei pela manhã, muito cedo, ele já estava em seu posto.

A igreja aberta.

Ele de prontidão aguardando o povo que chegaria.

Olhei em seu rosto e vi em sua face aquela satisfação da missão cumprida, do prazer do fazer bem feito, da alegria de servir por servir sem nada ter em troca que senão a certeza de que a eternidade o recompensaria.

Passei rápido e do carro o cumprimentei com a mão e um sorriso, o melhor que pude projetar.

Ele respondeu também com sorriso e um meneio de cabeça.

Entendo muito bem ele, seu trabalho, sua missão, sua alegria.

Já fui um dia o porteiro da igreja e sei o que é isso.

Parece ser um trabalho menor dentro de todo o aparato litúrgico de um culto, mas essa é uma visão minimalista, simplificada, para não dizer equivocada demais.

O porteiro é o primeiro dos evangelistas, o primeiro dos servos do Senhor Jesus.

Seu sorriso é a primeira luz que o homem natural recebe ao adentrar os umbrais da igreja.

Uma boa acolhida é o pontapé inicial para que a mensagem da salvação possa produzir bons frutos no inexpugnável coração humano.

As pessoas vêm até a igreja atrás de muitas coisas, as vezes querem somente um abraço, então, e somente então, o porteiro da igreja é o primeiro carinho, o inicial afago, a porta de entrada para um culto que pode transformar a vida de pessoas para esta vida e para a eternidade.

Sim, eu sei que vivemos tempos em que as pessoas não se satisfazem mais com o servir pelo servir, os títulos e a apoteose dos púlpitos brasileiros são uma tentação que muitos sucumbem, ser porteiro de igreja se tornou algo menor, quase que desprezado, como se a função não dignificasse aquele que a desempenha.

Quando alguém se torna por graças de Deus porteiro da sua igreja é dignificado, separado dos demais.

Quanta honra.

Aquele que recebe essa graça deve fazê-lo sempre com enorme alegria, galhardia, sempre me sentindo um privilegiado porque Deus poderia ter escolhido qualquer um dentro de todo o mundo, mas escolheu a ele para aquele função.

Ser escolhido pelos homens tem seu valor.

Ser escolhido por Deus não existe riqueza que pague isso.

Aquele porteiro daquela igreja naquela manhã entendia isso intimamente dentro de si.

Ali parado aguardando todo o povo era uma sentinela a serviço do Reino de Deus.

Ele sabia que ali, naquele exato lugar, naquele exato momento, em todo o universo era o melhor lugar para se estar e poucos, muito poucos, teriam o privilégio de servir.

Porque se pode almejar grandes cargos terrenos e se pode conquista-los de diversas formas: alguns com status, outros com concurso, poucos com dinheiro e até por indicação de poderosos.

Mas o porteiro da igreja não, jamais se conquista pela influência humana, pelo menos nunca poderia e deveria ser assim.

O porteiro da igreja é Jesus quem escolhe, porque a igreja é Dele, a obra é Dele e com ela nem o inferno pode prevalecer.

Quando virei o carro para ganhar a avenida e a rodovia que me levaria ao trabalho o sorriso do porteiro da igrejinha humilde havia desaparecido da frente dos meus olhos, mas ainda queimava em meu coração.

É esse o poder de um bom porteiro de igreja, seus sorrisos e amabilidades nos fazem querer glorificar e adorar ao Senhor.

Num instante, que lindo instante, me peguei glorificando ao Senhor estrada afora...

Abençoados sejam todos os porteiros fieis de igreja mundo afora.