sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

FRAGMENTOS DO DIÁRIO NUNCA ESCRITO POR MIM

A realidade é uma só!

Se o Alaska fosse no Brasil, Chris McCandless teria sido enterrado como indigente!

O MAIOR CONQUISTADOR DO MUNDO


Não era um belo rapaz, nunca o foi, nunca o seria. Era de baixa estatura, orelhas de abano, grandes olhos, lábios finos, nariz avantajado. Contudo, era a simpatia em pessoa. Bastavam duas frases e já estava conquistando. Homens e mulheres sucumbiam-lhe sob efeito dominó. Dos homens roubava poder e prestígio para si próprio, sem que percebessem, praticando um salutar tráfico de influências para aumentar sua rede de contatos e assim, partir para as conquistas que realmente lhe interessavam: as mulheres! Ah! Estas caiam como moscas em sua teia de gentilezas e galanteios exagerados. Suas frases eram rebuscadas e possuíam sob a epiderme dos vocábulos, um lirismo imperceptível aos ouvidos masculinos. Para eles, tudo o que dizia era piegas, brega. Para elas, era diferente, tentador, romântico.
Era comum vê-lo ao lado de uma bela mulher, não raro com a mais bela mulher. Sua filosofia barata apregoava para os mais chegados “O segredo é não pilotar “teco-teco”, meu esquema é com os boeings!” E assim seguia, colecionando conquistas em profusão. Quanto mais bela e mais difícil a mulher, mais excitado ficava. A estratégia tinha alguma complexidade. O modo de andar, o jeito de olhar, a abordagem, as palavras escolhidas a dedo, os trejeitos, tudo estudado, tudo em seu devido lugar, um movimento servindo de catarse para outro. Não havia falhas, sua psicologia inapta era uma benção para si, uma maldição para a “vítima” escolhida.
E as mulheres o amavam, e ele amava as mulheres com todo o furor de um sentimento loquaz. Estar ao seu lado era conhecer o Éden com todas as suas maravilhas. Estava sempre armado com uma gentileza, uma generosidade ampla, um sorriso branco que lhe escapava aos lábios e fazia brilhar-lhe toda a face.
Foram varias suas aventuras! Suas conquistas foram inúmeras. Chegou a ser comparado a Don Juan, mas rejeitou o apelido dizendo que o amante espanhol só queria sexo, ele não, abraçava a mulher por inteiro. Era um anjo que veio para tocar a alma feminina, jactava-se.
Um dia qualquer de verão, passeando de pedalinho em um lago dourado, viu não muito longe de onde estava, uma mulher a pedalar seu barquinho, sozinha, indefesa. Examinou-a: seu modo de vestir, seu penteado, apurou as narinas sentiu-lhe o perfume – seus pelos eriçaram, seus olhos brilharam, estava pronta e aquecida a máquina conquistadora, partiu ao encontro da bela musa.
Tudo seguiu seu “script” natural. Bruxo como era tomou das águas do lago o seu frescor e emprestou-lhe à própria pele. Um raio de sol vespertino veio colorir seu sorriso. O vento alisou seu cabelo pixaim. Seus olhos alugaram o azul do céu. Sua voz parecia a voz de uma Sílfide cantando para a alvorada. Falou qualquer coisa grotesca e a moça sorriu-lhe agradecida pela atenção súbita. À frente de seus olhos surgia um fado galante que vinha lhe salvar das terríveis águas da solidão. Num instante estava dentro do pedalinho da musa conquistada e, noutro instante, mais breve ainda, estavam dentro de seu Fuscão Verde 69 cujo ronco parecia (para os ouvidos femininos) o rugir de uma Ferrari.
No outro dia, nosso herói conquistador acordava num quarto de motel barato, ao seu lado o corpo de uma bela mulher descansava, após uma vigorosa noite de amor. Sorriu satisfeito e feliz enquanto suas mãos ternas percorriam lentamente as belas e fêmeas costas morenas...

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

A ÚLTIMA VIAGEM DE TAXI


Houve um tempo em que eu ganhava a vida como motorista de táxi. Os passageiros embarcavam totalmente anônimos. E, ás vezes, me contavam episódios de suas vidas, suas alegrias e suas tristezas.
Encontrei pessoas que me surpreenderam. Mas, NENHUMA como aquela noite de 25 para 26 de julho do último ano em que trabalhei na praça!
Havia recebido já tarde da noite uma chamada vinda de um pequeno prédio de tijolinhos, em uma rua tranqüila do subúrbio de Belo horizonte, capital das Minas Gerais.
Quando cheguei ouvia cachorros latindo longe. O prédio estava escuro, com exceção de uma única lâmpada acesa numa janela do térreo.
Nestas circunstâncias, outros teriam buzinado duas ou três vezes, esperariam só um pouco e, então, iriam embora.
Mas, eu sabia que muitas pessoas dependiam de táxis como único meio de transporte a tal hora. A não ser, portanto, que a situação fosse claramente perigosa, eu sempre esperava....
“Este passageiro pode ser alguém que necessita de ajuda”, pensei. Assim, fui até a porta e bati. “Um minutinho”, respondeu uma voz débil e idosa.
Ouvi alguma coisa a ser arrastada pelo chão...Depois de uma pausa longa, a porta abriu-se. Vi-me então diante de uma senhora bem idosa, pequenina e de frágil aparência!
Usava um vestido estampado e um chapéu bizarro daqueles usados pelas senhoras idosas nos filmes da década de 40! E se equilibrava numa bengala, enquanto segurava com dificuldade uma pequena mala...
Dava para ver que a mobília estava toda coberta com lençóis. Não haviam relógios, roupas ou adornos sobre o móveis. Num canto jazia uma caixa aberta com fotografias e vidros...
A velha senhora, esboçando então um tímido sorriso de quem havia já perdido todos os dentes, pediu-me:
“O Senhor poderia me ajudar com a mala?”
Eu peguei a mala e ajudei-a a caminhar lentamente até o carro. E enquanto se acomodava ela ficou me agradecendo...
“Não é nada, apenas procuro tratar meus passageiros do jeito que gostaria que tratassem minha velha mãe”... “Oh!, Você é um bom rapaz!”
Quando embarcamos, deu-me um endereço e pediu:
- “O senhor poderia ir pelo centro da cidade?”
- “Este não é o trajeto mais curto”, alertei-a prontamente.
- “Eu não me importo... Não estou com pressa... Meu destino é o último! O asilo dos velhos”...
Surpreso, eu olhei pelo retrovisor. Os olhos da velhinha brilhavam marejados...
- “Eu não tenho mais família e o médico me disse que tenho muito pouco tempo”...
Disfarçadamente desliguei o taxímetro e perguntei:
- “Qual o caminho que a senhora deseja que eu tome?”
Nas horas seguintes nós dirigimos por toda a cidade. Ela mostrou-me o edifício na Praça 7 em que havia, em certa ocasião, trabalhado como ascensorista...
Nós passamos pelas cercanias em que ela e o esposo tinham vivido como recém-casados. E também pela Igrejinha de São Francisco, na Pampulha, onde comemoraram Bodas de Ouro!
Ela pediu-me que passasse em frente a uma loja de móveis na região da praça da liberdade, que havia sido um grande salão de dança que ela freqüentara quando mocinha!
De vez quando, pedia-me para dirigir vagarosamente em frente a um edifício ou esquina. Era quando ficava então com os olhos fixos na escuridão, sem dizer nada... E olhava. Olhava e suspirava.
E assim rodamos a noite inteira... Quando o primeiro raio de sol surgiu no horizonte, ela disse de repente: “Estou cansada... E pronta! Vamos agora!”
Seguimos, então, em silêncio, para o endereço que ela havia me dado. Chegamos a um prédio rodeado de árvores, uma pequena casa de repouso.
Dois atendentes caminharam até o táxi, assim que paramos. Eram amáveis e atentos e logo se cercaram da velha senhora, a quem pareciam esperar.
Eu abri o porta-malas do carro e levei a pequena mala até a porta. A senhora já sentada em uma cadeira de rodas, perguntou-me então pelo custo da corrida.
- “Quanto lhe devo?” ela perguntou, pegando a bolsa.
- “Nada!” eu disse.
- “Você tem que ganhar a vida, meu jovem!”
- “Há outros passageiros”, respondi.
Quase sem pensar, curvei-me e dei-lhe um abraço. Ela me envolveu comovidamente e devolveu-me com um beijo afetuoso e repleto da mais pura e genuína gratidão” E disse:
- “Você deu a esta velhinha bons momentos de alegria, como não tinha há tanto tempo... Só Deus é quem sabe o quanto você fez por mim! Obrigada, MEU AMIGO! Mil vezes obrigada!!!”
Apertei sua mão pela última vez e caminhei no lusco-fusco da alvorada sem olhar para trás, pois as lágrimas corriam-me abundantes pela face....
Atrás de mim uma porta foi fechada. Era o som do término de uma vida... Naquele dia não peguei mais passageiros. Dirigi sem rumo, perdido nos meus pensamentos. Mal podia falar.
Dois dias depois, tomei coragem e voltei no asilo para ver como estava a minha mais nova amiga. Me disseram, então, que na noite anterior adormecera para sempre, em paz e feliz....
E fiquei a pensar, se a velhinha tivesse pego um motorista mal-educado e raivoso...Ou, então, algum que estivesse ansioso para terminar seu turno...
Oh, Deus! E se eu houvesse recusado a corrida? Ou tivesse buzinado uma vez e ido embora?... Ao relembrar, creio que eu jamais tenha feito algo mais importante na minha vida até então!


Texto de autoria desconhecida!
Chegou-me através de uma amiga que o conseguiu junto a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, Ministério Público.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

COMENTÁRIOS LITERÁRIOS

Santiago Nassar iria morrer, e todos sabiam disso!
Foi avisado, foi jactado, foi notificado para todos por seus assassinos e, ninguém fez nada!
Santiago Nassar morreu inocente da culpa que lhe imputaram!
A obra “Crônica de uma morte anunciada” do Nobel de Literatura Gabriel García Marques é um livro soberbo, é daqueles que devem constar na biblioteca de todos aqueles que amam a literatura naquilo que ela tem de mais belo.
Possui 177 páginas e é um romance rápido que deve ser lido numa única pegada, sem concessões. E, acredite, você o faz, não se consegue despregar dele por um mero instante. O autor imputa a um personagem do livro a contagem da história, e ele o faz num gênero meio de documentário, colhendo as impressões das personagens e tecendo as suas próprias, fazendo desta colcha de retalhos uma contagem primorosa da história – aliás, característica primeira de Márquez, ser um excelente contador de histórias.
O enredo é bem diferenciado, a história dá saltos aqui e ali e desde o primeiro momento se sabe que Santiago Nassar será morto, mas, mesmo assim, você fica na torcida para que o autor esteja errado, para que algo aconteça e ele não morra. Mas, infelizmente, a omissão, o descaso, o fato de não acreditar, enfim, por diversos motivos, as pessoas deixam Santiago desavisado e quando ele vem saber, já é tarde demais.


“Por último, fizeram as facas cantar na pedra, e Pablo pôs a sua junto a uma lâmpada para que brilhasse.
- Vamos matar Santiago Nassar – disse.”





Sou suspeito de falar de G.G.Márquez, sou fã confesso de seu estilo e de sua literatura. Tenho três livros deles, e todos três maravilhosos, um deles, o Nobel de Literatura de 1982, Cem anos de solidão. Além dele, este ao qual comento agora e mais Memória de minhas putas tristes. A próxima empreitada será O amor nos tempos do cólera, outra famosa obra deste colombiano extraordinário.



“As luzes estavam apagadas, mas logo que entrei senti o cheiro de mulher morna e vi os olhos de leoparda insone na escuridão, e depois não voltei a saber de mim mesmo até que começaram a soar os sinos.”



Espero que leiam e que tenham o mesmo êxtase que tive. A leitura ainda continua sendo o maior de meus vícios e os livros, meus melhores momentos de excitação e prazer.








CRÔNICA DE UMA MORTE ANUNCIADA, Gabriel García Márquez, Editora Record.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

TUA NUDEZ !!!



Tua nudez é um assombro!
Habitam em teu corpo
A maledicência,
A concupiscência,
O obsceno,
O impuro,
O profano.
Tua nudez é mais que erótica,
Concubina dos olhos masculinos.
Tua nudez encerra em teus vestidos,
Derrotados guerreiros da decência,
A incapacidade de emprestar-lhes virtude.
Teus olhos.
Teus cabelos.
Tua boca.
Tudo em você transpira sensualidade.
Tua nudez excita maldições
Aos felizardos e incautos dedos que a toca.
Tua nudez foi concebida por Deus,
Feita impura pelo demônio,
Emprestada perfeita aos homens,
Para conduzi-los, em grandes bandos,
Como cicerone às portas do inferno!

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Meus queridos!!!

Acabei de ler "CRÔNICA DA MORTE ANUNCIADA" do G.G.Márquez, escritor colombiano que está entre os meus prediletos. Estou em estado de extâse profundo tamanho o prazer da leitura, este post é somente para informar-lhes isso, mais tarde, venho com outro para dar considerações mais aprofundadas.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009


O servo anunciou ao rei: “Senhor, o santo Narottan nunca se dignou entrar no teu templo real. Ela canta louvores a Deus sob as árvores, em campo aberto. Ninguém mais vai adorar no templo. Todos se reúnem em torno dele, como abelhas ao redor de um lótus branco, e deixam vazio o jarro dourado para o mel”.

O rei ficou profundamente irritado. Foi até o campo onde Narottan rezava, sentado na relva, e lhe disse: “Pai, porque abandonas o templo com a cúpula de ouro, e ficas aí, sentado no chão, para anunciar o amor de Deus?”

Narottan respondeu: “É porque Deus não está em teu templo”.

O rei olhou com desagrado, e disse: “Não sabes que foram gastos vinte milhões em ouro para construir aquela obra de arte, e que depois o templo foi consagrado a Deus com ritos custos0s?”

“Sei disso” – respondeu Narottan.
“Sei também que ele foi construído naquele ano em que o fogo destruiu a casa de centenas de famílias do teu povo, e que elas em vão se prostraram à tua porta, pedindo ajuda. E Deus já dizia: ‘Pobre criatura que não pode oferecer abrigo a seus irmãos, e pretende construir a minha casa!’ Deus foi fazer companhia aos desabrigados, debaixo das árvores do campo... Essa pompa de ouro de que estás falando não tem dentro dela nada mais que o ardente vapor de teu orgulho”.

O rei se enfureceu e gritou: “Vai embora de meu Reino!”

O santo lhe respondeu tranquilamente: “Sim, expulsa-me para onde expulsaste o meu Deus”.



Rabindranat Tagore (1991, poema 34), do livro A Colheita, Edições Paulinas
Foto: Poeta indiano Rabindranath Tagore


Rabindranth Tagore é um poeta indiano nascido em 1861, Calcutá, e morto em 1941, Bengala. Foi músico, poeta, contista, teatrólogo e filósofo, foi Prêmio Nobel de Literatura em 1913. Sua obra e poesia remete a Deus e a natureza fazendo uma junção perfeita entre estas duas maravilhas. O amor, em todas as suas manifestações, também é bastante cantado em seu modo todo peculiar de escrever. Aprendi a gostar de Rabindranath a algum tempo atrás, quando por acidente, um livro seu chegou-me as mãos. De lá para cá, de quando em quando, volto a ler a sua obra e sempre que possível, dou um jeito de adquiri um livro de sua bibliografia.

Agora, acabei de ler “A COLHEITA”, livro lançado pelas Edições Paulinas, em 1991, na coleção Vida e Meditação. O livro é uma antologia de poemas escritos em diversas fases da vida do poeta indiano, uma coletânea com 86 obras primas poéticas e místicas do autor. São poemas que nos encantam não tão somente pela sua beleza textual, mas, sobretudo, eu acredito, pela sabedoria que eles possuem em sua essência. Rabindranath faz de sua poesia algo não tão somente para nos encantar em belas tardes nas varandas de nossas casas, e sim, um instrumento poderoso para enxertar de sabedoria e ensinamentos os nossos corações.


Vou pronunciar o teu nome quando estiver sozinho,sentado entre as sombras dos meus pensamentos silenciosos.
Vou pronunciá-lo sem palavras e sem motivo.
Sou como a criança que chama cem vezes por sua mãe,alegre de apenas poder falar "mãe".
(Rabindranat Tagore (1991, poema 82), do livro "A Colheita", Edições Paulinas")

QUANDO O AMOR ENOBRECE!


Quando a vi pela primeira vez, suspirei fundo. Não entendi de antemão o que significava aquele suspiro. Somos tolos o bastante para ficarmos questionando os porquês dos momentos, em vez de nos entregarmos simplesmente ao frenesi de vivenciá-los em sua plenitude. Eu fiz isso. E ainda hoje, mesmo após tantas imolações que fiz no altar desse sentimento, martirizo-me pela minha ignorância. O que faço é fechar os olhos e deixar meu espírito viajar as estrelas, o lugar onde o espaço é nada e o tempo é tudo. De alguma forma, nesses instantes de completa introspecção, ressuscito aquele momento e posso então, liberto da estupidez e da covardia originais, vivenciar o maior de todos os momentos na vida de um homem, aquele instante glorioso e sublime onde homem e amor encontram-se, fazendo-se únicos, vislumbrando uma mulher em toda a sua essência.

Eu suspiro fundo novamente.

Eu caio. Caio por um abismo, sem gritos, sem terror, sem tentativas desesperadas de me agarrar as paredes desse sentimento sem fundo. Dou um sorriso que reflete minha alma. Meu coração bate forte, melodia do amor. Não abro meus olhos, desnecessário, vejo tudo muito claramente agora. Sem amor somos cegos e vadios. Com amor vemos a felicidade e além dela, ganhamos nobreza.

Necessitamos tanto de nobreza.

Esta faculdade está esquecida neste mundo feito de alegrias falsas, de ambições vorazes, de escolhas insensatas.

Eu necessito tanto de nobreza. Tive minha parcela de felicidades pagãs e escolhas malditas. Ah! Malditas, malditas escolhas àquelas as quais fiz!

Insisto em manter os olhos fechados, ainda que essa lágrima fugitiva de minha vergonha queime meu rosto. Alguém me disse que arrependimento me redimiria de minhas escolhas, me traria a nobreza perdida. É verdade, de alguma forma experimentei essa condição de poder olhar o mundo, de novo, olho no olho, sem que meu rosto corasse, ou minha culpa sangrasse novamente. É muito bom você poder enxergar seu sorriso brilhando no espelho da retina de outra pessoa. Contudo, apesar destas verdades que não desprezo, louvo-as até, fica-me uma certeza de que a nobreza verdadeira, aquela cristalina de grandes brilhos, somente se conhece com o advento do amor.

Porque o amor estende a mão e levanta todos os que caíram, o amor perdoa e purifica nossa alma. O que se quebrou, ele conserta. Endireita os que se desviaram é bússola para um futuro cheio de novas possibilidades transparentes.

O amor enobrece. O amor me enobreceu.

Abro os olhos agora. Posso ver a vida novamente. Levanto-me desta viagem para dentro de mim mesmo. Não tenho mais pecados. Não tenho mais vergonha. O amor me perdoou.

Suspiro fundo pela milésima vez ao ver o rosto do amor, o rosto lindo de minha amada!


Madrugada de 09/02/2006, às 4.45 horas
Ilustração: Van Gogh, 1887, quadro”Woman Nude Reclining”

domingo, 15 de fevereiro de 2009

CORES E SENTIMENTOS

Eu tomo o azul em minhas mãos.... Pinto um paraíso com ele.
Serão os paraísos mesmo azuis?
O vermelho atingi-me o rosto.... Há desejo no vermelho, há medo, há intensidade selvagem, a paixão é vermelha.
Sinto um tremor na espinha.... Será tesão..... Será medo.... O que o vermelho provoca em mim não consigo explicar, tenho medo do que não entendo.
Cubro-me de branco..... A paz e o sossego são alvos!
Apesar da tranqüilidade, não há felicidade plena no branco.... A vida é feita de cores.
Monto no verde e alço um vôo desesperado.... O horizonte esconde algo mais. Por que sempre queremos algo mais?
Não quero mais viver de verdes e de esperanças, quero o meu quinhão agora.
Oferecem-me o amarelo.... A fortuna é dourada.
Dou um sorriso ralo, a felicidade não está nas riquezas.
Cansado, adormeço, abraço a cor negra, abraço a noite.



A noite é uma amante insaciável, não nos da paz um minuto sequer, ela enche-me de desejos outros, de sonhos outros, de emoções outras..... Gosto da cor negra. Mas ainda é pouco, o preto, assim como o branco, são indispensáveis, mas insuficientes.
Pego uma nova aquarela nas mãos e invento novas cores. Pinto o céu de translúcido, sem cores nenhuma, para que possamos ver através dele, para que possamos enxergar os anjos, a transparência é a verdade.
Pinto o ouro de negro e jogo-o todo em uma caverna escura. O mundo seria um lugar melhor sem riquezas.
Pinto os mares de vermelho, vermelho sangue, a água é o sangue do Planeta, e o sangue deve ser sempre vermelho.
Invento cores que nem mesmo sei o nome, não parei para inventar nomes, parei para inventar cores.... Cada nova cor, novo sentimento.



Expilo uma lágrima azul enquanto amo a mulher amada sob uma lua amarela. Faço amor colorido, sobre um lençol de cetim púrpura.... Ela sorri..... Um sorriso vermelho paixão. Suas unhas rasgam minhas costas brancas que explodem em um liquido verde, meu sangue é verde. Neste novo universo é assim, não são mais as plantas que realizam a fotossíntese, é o amor dos amantes que possuem esta incumbência, quanto mais amor, mais oxigênio. Amemos então.... Amemos então!



Meu sêmen é a seiva da vida.... A mulher o recebe o acolhe como se fizesse a colheita numa seara de verão. Uma barriga se forma, o útero do mundo respira novamente. O Criador ainda acredita na humanidade. Uma criança nasce, chora, sorri, cresce. As cores se formam novamente, as cores renovam-se novamente, a vida pintada em todas as tonalidades, abstrato e concreto dançando sob um sol dourado, a guitarra de Clapton anuncia com Rivers of Tears a alvorada deste novo mundo.



A criança que nasce é metade branca, é metade negra. Depois dela ficaremos imunes aos preconceitos tolos. Batizo-a em nome de Deus, quebro todas as placas de religiões do mundo. Depois dela, não haverá mais religiões. O Criador sorri comigo, ele me conta uma piada que fala de Santos.
A criança fala, e todos o entendem. A língua do amor é universal.
Eu choro novamente, minhas lágrimas azuis.
Do espaço o astronauta refaz a frase que diz que o mundo seja azul: “O mundo é colorido!” Canta o cosmonauta. O mundo deveria mesmo ser pintado com novas cores...cores por todos os lados... As cores dos sentimentos!


Foto: http://www.olhares.com/
Moldura: O autor do texto

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

UM ATO DE CORAGEM


Não quero mais viver...

... De promessas vazias...
... Com o pão prometido...
... De justiça sonhada...
... De terra arrendada...
... De ferramentas emprestadas...
... De sonhos emprestados...
... Com gente de qualidades aparentes...
(e com defeitos sólidos!)
... Fazendo parte de um rebanho...
... Sendo o herói de revoluções estúpidas...
... Com ideologias obsoletas...
... Preocupado em ser rico ou pobre...
... Dopado com status e poder...
... Com medo...
... Com coragem...
... Vegetando sorrisos no cotidiano.

Não quero mais viver de qualquer jeito desse jeito!

Quero apenar viver...

Porque não importa o lado que eu escolha, todos estão errados. Os justos são também injustos, e os injustos serão justos um dia. Temos todos um pouco de anjos, um bocado de demônios. Chega de certezas descartáveis, desta vida buscada para ser feliz do jeito que eles todos querem que sejamos ser.

Quero apenas viver a vida, como ela se apresenta!

Sem aferições, sem medições, sem julgamentos, sem condenar quem quer que seja e a mim próprio: somos todos culpados, somos todos inocentes!

Não quero mais me perdoar todos os dias, pelos erros que eu não cometi, pelas conquistas que não tive, pelos prazeres que não gozei.... Nem quero apontar mais o dedo para ninguém chamando-o de fracassado.

Quem é realmente fracassado nesta vida?

Respondam vocês, cansei de buscar respostas tolas para questões igualmente tolas.

Minha única preocupação agora, ser feliz de verdade!

Sem escolher caminhos,
Sem ser escravo das aparências.

Aprendi que não existem lados corretos, estão todos errados, inclusive eu! A realidade é uma grande mentira, devo ser justo primeiro comigo, antes de ser com o próximo.

O que existe mesmo é o meu coração sedento de felicidade e o que ele deseja de verdade para ser feliz.

Eis o maior ato de coragem de um homem, ser feliz de verdade!!!




Foto: www.olhares.com

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009


O filme NA NATUREZA SELVAGEM ( INTO THE WILD, em inglês), com direção de Sean Penn conta a história do jovem Chris McCandless, jovem americano muito inteligente, rico, e com um futuro brilhante pela frente abandona tudo e saí em direção ao Alaska, numa viagem aventureira e selvagem. Adota o nome de Alexader Supertramp, e sem dinheiro e sem documento, sai andando pelos EUA à procura de liberdade e aventuras e as encontra em profusão. A história é dramática, belíssima, o filme conta com uma trilha sonora de Eddie Vedder (Pearl Jam) maravilhosa.
Veja a carta, para se ter uma idéia do pensamento do jovem aventureiro, que ele escreve para Ron, que ele conheceu durante a aventura e que, na época, contava com 81 anos de idade:


“Ron, eu realmente gostei de toda a ajuda que você me deu e do tempo que passamos juntos. Espero que não fique muito deprimido com nossa separação. Pode levar um bom tempo até que a gente se veja de novo. Mas desde que eu saia inteiro desse negócio do Alasca você terá notícias minhas no futuro. Gostaria de repetir o conselho que lhe dei antes: acho que você deveria realmente promover uma mudança radical em seu estilo de vida e começar a fazer corajosamente coisas em que talvez nunca tenha pensado, ou que fosse hesitante demais para tentar. Tanta gente vive em circunstancias infelizes e, contudo, não toma a iniciativa de mudar sua situação porque está condicionada a uma vida de segurança, conformismo e conservadorismo, tudo isso que parece de paz de espírito, mas na realidade nada é mais maléfico para o espírito do homem que um futuro seguro. A coisa mais essencial do espírito vivo de um homem é sua paixão pela aventura.
A alegria da vida vem de nossos encontros com novas experiências e, portanto, não há alegria maior que ter um horizonte sempre cambiante. Cada dia um novo e diferente Sol. Se você quer mais de sua vida, Ron, deve abandonar sua tendência à segurança monótona e adotar um estilo de vida confuso que, de início, vai parecer maluco para você. Mas depois que se acostumar a tal vida verá seu sentido pleno e sua beleza incrível. Em resumo, Ron, saia de Salton City e caia na estrada. Garanto que ficará muito contente em fazer isso. Mas temo que você ignore meu conselho. Você acha que eu sou teimoso, mas você é ainda mais teimoso do que eu. Você tinha uma chance maravilhosa quando voltou da visita a uma das maiores vistas da terra, o Grand Canyon, algo que todo americano deveria apreciar pelo menos uma vez na vida. Mas, por alguma razão incompreensível para mim, você só queria voltar correndo para casa, direto para a mesma situação que vê dia após dia. Temo que você seguirá essa mesma tendência no futuro e assim deixará de descobrir as coisas maravilhosas que deus colocou em torno de nós para descobrir. Não se acomode nem fique sentado em um único lugar. Mova-se, seja nômade, faça de cada dia um novo horizonte. Você ainda vai viver muito tempo, Ron, e será uma vergonha se não aproveitar a oportunidade para revolucionar sua vida e entrar num reino inteiramente novo de experiências. Você está errado se acha que a alegria emana somente ou principalmente das relações humanas. Deus a distribuiu em toda a nossa volta. Está em tudo e em qualquer coisa que possamos experimentar. Só temos de ter a coragem de dar as costas para nosso estilo de vida habitual e nos comprometer com um modo de viver não convencional. O que quero dizer é que você não precisa de mim ou de qualquer outra pessoa em volta para pôr esse novo tipo de luz em sua vida. Ele está simplesmente esperando que você o pegue e tudo que tem a fazer é estender os braços. A única pessoa com quem você está lutando é você mesmo e sua teimosia em não entrar em novas situações. Ron eu espero realmente que, assim que puder, Você saia de Salton City, ponha um pequeno trailer na traseira de sua picape e comece a ver algumas das obras que Deus fez aqui no Oeste americano. Você verá coisas e conhecerá pessoas e há muito a aprender com elas. Deve fazer isso no estilo econômico, sem motéis, cozinhando sua comida como regra geral, gastando o menos que puder e vai gostar imensamente disso. Espero que na próxima vez que o encontrar você seja um homem novo, com uma grande quantidade de novas aventuras e experiências na sua bagagem. Não hesite nem se permita dar desculpas. Simplesmente saia e faça isso. Você ficará muito, muito contente por ter feito.”


O final dramático nos deixa tristes mas, ao mesmo tempo, nos deixa esperançosos com a humanidade, enquanto existir jovens como Alexander Supertramp nós ainda teremos uma chance.
Merece ser visto, sinceramente!

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

MAS, O QUE FAZER?


Sei que tu me deixarás e
De dor e sofrimento se encherá minha vida.
Mas, o que fazer?
Tenho que ter você nem que seja por um
Mero instante dentro da eternidade!
Não nego que haverá aqueles que me chamarão de louco,
Por atirar-me em uma relação
Que tem todas as cores de aventura,
E cujo horizonte já vem carregado de nuvens negras...
Mas, o que fazer?
Eu prefiro ser feliz num lampejo de um breve instante,
Conhecer todas as alegrias e os prazeres
Que somente um verdadeiro amor pode proporcionar,
Do que atravessar toda a existência
Marcado pela sobriedade
E pela pasmaceira da normalidade.
Sei, como sei que sou louco em agir assim,
Em renegar as águas tranqüilas de uma relação estável,
Para navegar nos mares revoltos da paixão...
Mas, o que fazer?
Como posso negar-me a beleza e a magia
De algumas noites perfeitas?
Como posso negar-me a chance de escrever as mais belas
Páginas de amor que serão escritas em minha vida e que,
De tão belas, serão relembradas pela vida inteira?
Oh! Eu sei que toda essa poesia louca
Trará algo mais em sua algibeira.
Este é o tipo de benção que somente vem acompanhado de alguma maldição.
Ninguém pode ser mesmo tão feliz nesse plano...
Mas, um dia, quando todo o peso
De meus dias estiver sobre meus ombros,
Eu poderei dizer:

Eu conheci o paraíso na terra
E para mim ele veio como sendo algumas noites de amor perfeito!

E, quando a morte abrir suas pernas para mim
E convidar-me para fazer amor,
Ela cochichará em meus ouvidos:

- Faça... faça do jeito que fizestes com ela, naquela noite em que as estrelas brilharam mais refletindo vossos sorrisos.

E todos os portões do paraíso se abrirão, novamente para mim...


Foto: Helmut Newton

sábado, 7 de fevereiro de 2009

UM HOMEM APAIXONADO


Foi um desses apaixonados, pela vida, pela noite, pelas estrelas, pela poesia, pelos cânticos da floresta. Pelas mulheres, apaixonou-se uma centena de vezes, duas centenas de vezes. Daquelas paixões de lágrimas e cartas, de flores e bombons, de pegares de mãos e crepúsculos do sol. Fazer o que, conformava-se. Era o último dos românticos. Frase já tão remoída, mas que com ele ganhava novos contornos. As mulheres adoravam-no. Ele instigava nelas o seu instinto maternal. Era do tipo que elas queriam por perto, para confortá-lo, para vê-lo falando coisas bonitas, para serem alvo de suas gentilezas mais banais. Em seus olhos viviam cravados o brilho da sinceridade, e este brilho tirava delas tudo o que ele queria. Elas voltavam a ser crianças, se abriam de corpo e alma para um amor absoluto que fazia de todas elas mais mulheres, melhores enquanto seres humanos. Sentiam-se protegidas com ele. E ele, adorava protegê-las, dar-lhes tudo o que ele tinha, pois com ele não tinha “fragmentos”, entregava-se todo em todas as espécies de relacionamento.

A paixão é a maior entre todos os estímulos do homem.

Tudo no homem é melhor quando ele o faz apaixonado!

Descobriu isso em algum dia em sua vida. Não marcou isso no calendário da parede de sua casa de taboas, deixou latente no coração. Daí para frente, desde que se conheceu como gente, em tudo se entregava de corpo e alma, apaixonado, como se a vida fosse somente dele, como se não fosse haver mais tempo para nada, como se o dia de amanhã não fosse existir.

Ah! É certo que quebrou a cara dezenas de vezes, os apaixonados sempre sofrem mais. Mas não havia jeito, assim que a ferida cicatrizava lá estava ele novamente, com uma nova paixão a massagear o coração. Para justificar-se, ressuscitava Menoti Del Pichia “Amar é sofrer, não amar é sofrer mais...". Era um incorrigível e delicioso romântico. Amou tanto e tanto fez amar que seria impossível contar todas as suas histórias. Como palavrear o sentimento mais puro de um coração sensível?

Foi o maior de todos os apaixonados... O maior!


E um dia, simplesmente partiu. Não nos deixou uma carta, não nos deu um abraço, um aceno, um último adeus!

As vezes, alguém mais saudoso diz que o sente na brisa. Outros dizem que o vê nas estrelas. Outros mais atrevidos dizem que ele vive no fundo dos olhos de uma mulher. Para mim nada disso importa, é transcendental demais para minha consciência secular. Nunca ninguém conseguiu entendê-lo realmente, e nem ver em toda a sua plenitude a sua maior vocação – a paixão pela vida. Ao final, quando em seu sumiço repentino, apaixonou-se pela morte e foi-se embora com a última das amantes, a galope, fazendo amor com ela entre as estrelas....Era realmente um apaixonado incorrigível!

EPITÁFIO


Fazia uma noite escura lá fora
E o vento entrava frio pela
Fresta da janela.
Meu quarto...contaminado de saudade,
Era o triste palco de minha dor,
Contrastando com o passado
Carregado de felicidade.
Num canto lamurioso e murcha pelo tempo,
Uma flor repousava
Aguardando seu destino.Sobre o guarda-roupa,
Um monte de cartas recordava uma época,
Que há muito se foi.
Tudo tinha uma tonalidade triste,
Perdido no meio da dor!
(e que dor!!!)
Meus olhos estavam secos,
Não havia mais lagrimas para derramar.
Tudo o que restou foi a dor,
A maldita dor e....
Sofrer em silêncio.
Enquanto isso,
Nos lençóis brancos
Uma rosa vermelha se formava,
Forte e vibrante.
A vida se esvai,
Foge para outra dimensão,
Escapa da desgraça e da tristeza
E corre em rumo ao desconhecido.
Nada mais a perder...
Nada mais a ganhar...
Somente...morrer!!!

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

ENQUANTO A CHUVA CAÍA...


Por um momento, eram novamente crianças. Brincavam na chuva, sorrindo, com a despreocupação daqueles que tem a vida feita. Não eram mais homens, com as responsabilidades e as convenções de homens. Por um momento, não tinham mais passado, isto, por um breve momento, porque não ter passado, para a maioria deles, era uma dádiva. Para eles, o passado é um aguilhão terrível que tortura as suas almas e o seu corpo. Em seus casos, o passado somente não é pior que os seus futuros.

Porque na verdade o passado não é feito de perguntas, estas estão no futuro. Nele estão muitas das respostas que buscamos do que somos hoje. Como a vida pode ser maravilhosa quando no nosso futuro, as respostas já estão razoavelmente garantidas pelo que fazemos hoje, pelo que fizemos ontem. Este é o grande sabor da vida, percebem? Ter as ferramentas e as condições para responder as questões que a vida nos coloca. E é lá, no passado, com todas as suas histórias, boas e más; com todos os seus rostos, bons e maus, que construímos as condições para nos colocarmos de frente com o futuro, sem temê-lo, pronto para enfrentá-lo.

Enquanto a chuva caía, os homens permitiram-se algumas picardias. Correram na chuva, gargalhando intensamente. Rolaram pelo chão, brincaram de pega, tiraram a camisa e as agruras de suas vidas. A infância é necessária. Ela é a resposta para muitos futuros.

Mas, para estes homens, a infância chegou tarde, desconectada com o tempo. Esta infância artificial, dissimulada, não tem poder. Eles estão velhos e suas respostas para a vida já estão encravadas em seus corações embrutecidos. Todavia, ainda que seja falsa, esta infância ganha importância. Eles sorriem, e não há nada espúrio por trás de seus sorrisos. Os adultos possuem este lamentável dom, somente riem do malicioso, do capcioso, ao contrário das crianças que riem das coisas simples e puras.

Por um momento, um breve momento, enquanto a chuva caía, e somente enquanto a chuva caía, eles foram as crianças que nunca foram um dia, e que jamais o serão... Não existem mais perguntas em seus futuros, há uma única resposta comum a todos eles: presos!!!



Imagem disponível em http://nikitas.blogs.sapo.pt/arquivo/chuva.JPG

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

APRENDENDO A SONHAR...


Desde os seis anos eu já tinha uma mente imaginativa, não sei se motivada pela visão dos quadrinhos de super-heróis americanos, não sei se pelas miríades de brincadeiras que fazia nas empoeiradas ruas de Paraná d’Oeste, uma pequena cidade do Paraná com cara e jeito de pequena cidade. Só sei que já sonhava e de tanto sonhar acordado um dia caí um belo dum tombo e cortei feio o joelho, um rasgo de onde desprendia-se um jorro vermelho que me arrancou sonoros gritos de socorro – os sonhos não devem jamais ser vermelhos.


Mamãe chegou apavorada e, entre lágrimas nos olhos e outros gritos de socorro, levaram-me ao farmacêutico da cidade que queria me dar uns pontos no joelho. De primeira, não entendi essa de dar pontos em joelhos. Mas quando vi a agulha e a linha, soltei tão alaridos gritos que o farmacêutico, coitado, o Sr Afonso, desistiu da idéia rapidinho. O rasgo no joelho curou-se na marra, na base de curativos constantes e cuidados de mãe – entre todos os remédios, o cuidado de mãe é o mais próximo da panacéia.


Aos dezesseis anos, minha imaginação ganhou força, as aventuras eram mais exasperadas, mais bem formatadas, de tanto sonhar perdia o fôlego. Além disso, há que se reconhecer, motivado pelos hormônios que já fluíam em meu corpo adolescente, os sonhos ganharam alguns contornos concupiscentes, ainda que filtrassem todos através de uma consciência erigida sobre uma educação austera e pragmática. O berço é a gênese das melhores consciências.


Aos vinte e seis anos cometi a besteira de achar que havia encontrado o amor, e sepultei meus sonhos. Talvez tenha sido a única vez que deixei de sonhar e parti para a ação propriamente dita. Quebrei a cara. Sou melhor sonhador do que executor. Sempre soube disso. Os meus vinte e seis anos guardam lembranças que hoje merecem ser esquecidas. Porque entre sonhar o amor e encontrá-lo de forma aleijada, é preferível sonhá-lo. Meus sonhos com o amor sempre foram os melhores....


Hoje, meus sonhos rarearam, fico joeirando entre meus pensamentos sonhos pré-fabricados, e estes não valem. Se sorrio, ou se choro. Se corro, ou se ando. Se parto, ou se fico. Se escrevo, ou se leio. Não importa a estrada que tome, tento recuperar a fantástica capacidade de sonhar que tinha aos seis anos e que alguns, ao longo dessa vida tortuosa, me fizeram crer que era uma qualidade pouco desejável. Então, eu sonho, sonho com um garoto de seis anos, simplório na existência, simplório nos sonhos, e de felicidade sofisticada. Sonhar ainda é a única ponte que liga a realidade ao futuro cheio de novas possibilidades.


Queres ser feliz, sonhe.


Queres sonhar, queira ser feliz.


Parece ambíguo e complicado, mas é tudo muito simples. Por isso a maioria não acata esta verdade. Ela é simples demais, eles necessitam de fórmulas matemáticas, grifes e técnicos com PhD para dizer-lhes os caminhos a tomar. Os livros de auto-ajuda são os mais vendidos atualmente.


Eu prefiro sonhar... por isso, estou aprendendo novamente...a sonhar!


Ainda bate em meu peito um coração de sonhador!