O bairro, no passado, fora um daqueles lugares familiares onde todos de uma forma ou de outra, conheciam todos. Tempos de compadres, de bons dias e boas tardes, de gente que se ajuntava para compartilhar café e amizade. Mas, esse tempo houvera ficado para trás, trancado num baú onde as reminiscências misturavam-se as memórias desbotadas. Agora, por todos os lados erguiam-se edifícios e condomínios fechados, com suas camêras, alarmes e cercas elétricas, guardando gente que viera de todos os lados. A paisagem mudará, de quase bucólica, aconchegante e horizontal, transformar-se-á num horizonte de aço e concreto erguido rendendo graças para as nuvens ocas, trocando o verde dos gramados e o colorido das casas pelas calçadas cinzentas e o balanço acadêmico e monocromático dos prédios.
O progresso é necessário... O progresso é necessário... Como um mantra isto fora dito para o “Seo” Zé, fruto da argumentação fanática da construtora que tentava de todas as formas comprar sua velha casa de madeira. Naquele espaço, disse sorrindo fácil o emissário da grande empresa, iremos levantar um edifício residencial. Bem intencionado, “Seo” Zé olhou para a esquina onde outrora fora a residência de seu amigo e compadre Milton, um dos primeiros que sucumbirá a esta tal tentação e venderá seu lar. Mudou-se para um lugar distante, desconhecido de tudo e de todos e lá morreu como um “zé ninguém”, sem amigos. Uma pessoa, pensou “Seo” Zé, será mais valiosa quanto mais amigos ela tiver – mais amigos, mais valor. No lugar da casa do Milton erguia-se majestoso um prédio altíssimo, na frente uma tabuleta, um painel, sabe-se lá, pensou o “Seo” Zé, que designação dão para aquilo com um nome estrangeiro bem escrito e que ninguém sabia dizer o que era. Lembrou-se de velhos amigos: Pedro, Arnaldo, João, Isidoro, sorriu somando a esta a lembrança das crianças chutando bola na rua. Adeus! Adeus para tudo isso... Somente asfalto e carros para todos os lados. Tanto luxo e tanta riqueza disfarçando a frieza e a falta de harmonia. Onde está a humanidade nestas coisas? A pergunta ficou sem resposta na consciência e no coração do velho homem...
“Seo” Zé agradeceu e recusou a proposta de compra, como sempre fizera e como sempre o faria, uma oferta recheada de muito dinheiro com cifras bem acima do valor de mercado do imóvel. Tentaram de todas as maneiras, construtora, filhos e netos persuadir o “Seo” Zé de vender sua antiga casa. Mostraram as benesses com belos sorrisos: lucro, dinheiro, tranqüilidade financeira, aposentadoria sossegada. Não adiantava, ele não vendia... Não vendia...
... E, quando sozinho, ele se deixava levar em suas reminiscências, nestes instantes, cada tábua, cada árvore, cada móvel, cada pedacinho de chão carregava uma história. Nesses momentos, “Seo” Zé sentia-se mais vivo, vigoroso, fazendo parte de algo maior, algo pelo que realmente valia a pena viver; nesses momentos, “Seo” Zé sentia-se conectado com as coisas e com aquele lugar que houvera crescido com ele, uma mistura mágica que todos os outros contaminados com o “vírus do progresso” nunca entenderiam. Nesses momentos, “Seo” Zé era o lugar, e o lugar vivia nele.
Mas, um dia, “Seo” Zé se foi, levado por um infarto do miocárdio. Mal o corpo foi enterrado e o negócio foi fechado entre a construtora e os descendentes, ávidos para dividirem o legado.
Meses depois, não havia mais sombra da passagem do “Seo” Zé. No lugar de sua casa, mais um edifício, transformando aquele pequeno oásis de lembranças num árido deserto de condomínios onde gentes e mais gentes moravam juntos e não se conheciam nunca.
Ainda sou daqueles que, como o “Seo” Zé, não se exultam com o desenvolvimento e o progresso de edifícios erguidos, sou daqueles que ainda choram por memórias e a fraternidade que resiste nas antigas casas de madeira mortas...
O progresso é necessário... O progresso é necessário... Como um mantra isto fora dito para o “Seo” Zé, fruto da argumentação fanática da construtora que tentava de todas as formas comprar sua velha casa de madeira. Naquele espaço, disse sorrindo fácil o emissário da grande empresa, iremos levantar um edifício residencial. Bem intencionado, “Seo” Zé olhou para a esquina onde outrora fora a residência de seu amigo e compadre Milton, um dos primeiros que sucumbirá a esta tal tentação e venderá seu lar. Mudou-se para um lugar distante, desconhecido de tudo e de todos e lá morreu como um “zé ninguém”, sem amigos. Uma pessoa, pensou “Seo” Zé, será mais valiosa quanto mais amigos ela tiver – mais amigos, mais valor. No lugar da casa do Milton erguia-se majestoso um prédio altíssimo, na frente uma tabuleta, um painel, sabe-se lá, pensou o “Seo” Zé, que designação dão para aquilo com um nome estrangeiro bem escrito e que ninguém sabia dizer o que era. Lembrou-se de velhos amigos: Pedro, Arnaldo, João, Isidoro, sorriu somando a esta a lembrança das crianças chutando bola na rua. Adeus! Adeus para tudo isso... Somente asfalto e carros para todos os lados. Tanto luxo e tanta riqueza disfarçando a frieza e a falta de harmonia. Onde está a humanidade nestas coisas? A pergunta ficou sem resposta na consciência e no coração do velho homem...
“Seo” Zé agradeceu e recusou a proposta de compra, como sempre fizera e como sempre o faria, uma oferta recheada de muito dinheiro com cifras bem acima do valor de mercado do imóvel. Tentaram de todas as maneiras, construtora, filhos e netos persuadir o “Seo” Zé de vender sua antiga casa. Mostraram as benesses com belos sorrisos: lucro, dinheiro, tranqüilidade financeira, aposentadoria sossegada. Não adiantava, ele não vendia... Não vendia...
... E, quando sozinho, ele se deixava levar em suas reminiscências, nestes instantes, cada tábua, cada árvore, cada móvel, cada pedacinho de chão carregava uma história. Nesses momentos, “Seo” Zé sentia-se mais vivo, vigoroso, fazendo parte de algo maior, algo pelo que realmente valia a pena viver; nesses momentos, “Seo” Zé sentia-se conectado com as coisas e com aquele lugar que houvera crescido com ele, uma mistura mágica que todos os outros contaminados com o “vírus do progresso” nunca entenderiam. Nesses momentos, “Seo” Zé era o lugar, e o lugar vivia nele.
Mas, um dia, “Seo” Zé se foi, levado por um infarto do miocárdio. Mal o corpo foi enterrado e o negócio foi fechado entre a construtora e os descendentes, ávidos para dividirem o legado.
Meses depois, não havia mais sombra da passagem do “Seo” Zé. No lugar de sua casa, mais um edifício, transformando aquele pequeno oásis de lembranças num árido deserto de condomínios onde gentes e mais gentes moravam juntos e não se conheciam nunca.
Ainda sou daqueles que, como o “Seo” Zé, não se exultam com o desenvolvimento e o progresso de edifícios erguidos, sou daqueles que ainda choram por memórias e a fraternidade que resiste nas antigas casas de madeira mortas...
4 comentários:
Pode haver muito mais vida nas casas de madeiras mortas do que nos edifícios lotados... Depende de cada um
Gostei, BjoxXD!
Oi Gilbertomeuzinho!
Vc não está sozinho!
Lá em BH moravamos em um bairro que se chama Padre Eustáquio, uma delicía de lugar. Sempre vamos lá quando estamos na capital e toda fez que chegamos no bairro não encontramos mais a casa de vários "seus Zè". Dá uma tristeza.
Bjs.
Gilberto, muito procedente esse seu exelente texto. No meu bairro todos os dias derrubam casas muito bem construídas e bonitas com muitas histórias de "Seus Zé". Como moro em um andar alto fico olhando como é difícil a demolição de casas que me parecem construídas para ser eternas. Sempre de meus olhos escorrem lágrimas ao ver como se apagam sem piedade histórias de vida. É a ganância vencendo sentimentos, o homem a viver em paredões de cimento e aço.
Um grande abraço.
Querido amigo,
O progresso e a evolução são necessários, mas perder a ternura, jamais...
Boa semana, beijos!!
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