domingo, 12 de abril de 2009

A DESPEDIDA


Surgiram de repente, muito de repente, como se numa decisão apressada a vida os houvesse desgarrado ali. Encostaram-se à parede, os corpos bem coladinhos, os desejos não totalmente satisfeitos mais encostados ainda. O corpo forte dele aninhou o corpo pouco nutrido dela e ofertou em sua face um sem número de beijos desesperados e apaixonados. As pessoas ao redor ficaram algo incomodadas com o som dos repetidos estalos de beijos desferidos como se tapas fossem, beijavam-se com um carinho violento. Publicamente, a visão de carícias entre amantes pode conter alguma poesia, mas, os sons produzidos, podem aborrecer bastante e os motivos deste incômodo são os mais variados.


Entre um beijo e outro, neste miserável espaço de tempo que possuíam, ele cochichava-lhe aos ouvidos alguma coisa. Ela ouvia com uma atenção displicente, sorrindo de quando em quando, concordando quase sempre com um leve meneio da cabeça. Talvez ele recitasse uma poesia (duvidamos disso, mas é algo que deve ser considerado como hipótese); talvez, passasse apenas algumas determinações de última hora; talvez, distribuísse alguns afazeres a serem cumpridos; talvez, despejasse alguns conselhos sábios para que a vida e sua carga ficassem mais leves (perdoe-nos o sorriso entredentes, esta hipótese é hilária!). De toda a forma, saber o que falavam não é mesmo importante e não nos cabe fazer julgamentos outros que senão mostrar a história, até porque, sublinha-se, a expressão corporal dela demonstrava pouco interesse em tudo o que ele dizia – ouviu a tudo com a mesma expectativa que ouviria o noticiário econômico da bolsa no jornal da meia-noite.


Quando, finalmente, o portão se abriu convidando a todas para irem embora, deram um derradeiro abraço e ele se agarrou fortemente as grades numa tristeza absurda – absurda por que ele sempre retornava para aquele lugar nada abençoado, reincidente, era um voluntário para o sofrimento, o arquiteto de sua dor. Olharam-se fixamente e o brilho dos olhares trocou a promessa do retorno, na semana que viria, no novo dia de visita que nasceria.
Separaram-se, enfim!

Ele... Ficou preso, como sempre...

... E, ela partiu envolta nesta estranha liberdade que é ser mulher de ladrão na cadeia...

3 comentários:

Cris França disse...

És um cronista fabuloso Gilberto!

Eu que não te conheço, só posso pensar aqui de longe se um dia nessa terra irei ter olhos, para ver o que mais ninguém vê...e dom de retratar isso como você o faz...

És pura inspiração...

Ricardo Rodrigues disse...

despedidas... a última, quis o destino que fosse evitada...

Regina disse...

Somente quem tem olhos sensíveis consegue retirar romantismo de um fato considerado "deprimente" e ainda conseguir fazer poesia...

Magistral...