sexta-feira, 30 de abril de 2010

DIVAGAÇÕES E BOLO DE MILHO

Enquanto aguardava que as pamonhas ficassem prontas, pedi um pedaço de bolo de milho. Estava belo, saboroso, cor e textura perfeita. Estava sentado debaixo de duas frondosas arvores, recebendo uma brisa de outono no rosto, o sol aquecendo meu corpo, diante de mim a igreja católica (a barraca ficava no que seria o pátio da igreja), por todos os lados uma grande plantação de milho.

Foi quando elas chegaram, galopando um carro que não sei falar o nome. A primeira era mais velha e desfilava uma empáfia monocromática, entrou, passou por mim e se dirigiu ao balcão feito de madeira e fez seu pedido, sentou-se taciturna deixando seu olhar perdido num ponto qualquer como se nada de toda a beleza do lugar a tocasse ou fosse suficiente para ela. A outra, era mais jovem, passou por mim e despejou um belo sorriso, aproximou-se do balcão, fez um comentário bem humorado com os atendentes sobre uma coisa qualquer, atirou olhares gentis para todos os presentes enquanto conversava sobre assuntos variados, no meio disso tudo, fez seu pedido, sentou-se na frente da outra, e ficou admirando tudo ao seu redor, parecia encantada. As pessoas chegam, as pessoas partem, estes são atos mecânicos e se repetirão agora e daqui a um milhão de anos. Mas, existem aqueles, que dotados de uma magia pessoal, conseguem fazer o ato da chegada, assim como o da partida, algo tão especial, que, mesmo quando eles não representam nada em nossas vidas, deixam algo de si na nossa lembrança, uma satisfação, como se fossem uma brisa fresca num dia quente. 

Era uma época onde eu estava num período de profunda introspecção, meus pensamentos filosofavam sobre a vida e sobre sua duração e sobre tudo o que deveríamos fazer aqui nesse plano. 

Era uma época onde a natureza me excitava e as pequenas coisas me traziam um gozo especial e extraordinário, havia percebido que a vida é urgente, sempre urgente e que as coisas que realmente são importantes não possuem preço e valor material (ou quando possuem, são irrisórios) – aprendi esta regra básica nestes tempos, quando a vida parecia querer me pregar uma peça e levei esta lição para todo o sempre, o sempre que durei ou duraria nesta terra. 

Daí a pouco, chegaram as pamonhas, respirei fundo absorvendo o cheiro inebriante do milho cozinhado em meio as especiarias. Sorvi um ultimo gole de um quente café que me foi generosamente servido, desses coado em filtro de pano, e dei uma ultima garfada no saboroso bolo de milho. Olhei para o céu azul, um pássaro passou voando rápido e sentou-se numa arvore próximo, num canto qualquer da barraca, nascia uma flor que não soube precisar o nome, senti que tanto pássaro como flor me olhavam, parecia que todas coisas me olhavam e eu devolvia o melhor de mim num olhar profundo para todas as coisas. Era como se a natureza quisesse estar em mim, e eu, por minha vez, queria estar em toda a natureza. 

Na mesa em frente, a moça continuava admirando tudo ao seu redor, a simplicidade do lugar era realmente tocante e sensibilizava os puros de coração; a outra circunspecta senhora despejava seus ares de autoridade e superioridade. Sem querer fazer acepções, as pessoas são o que são e devemos aceitá-las e amá-las na embalagem em que se apresentam, mas ao olhar a mesa, numa estranha analogia até mesmo para meus pensamentos nada tradicionais, via uma poesia e uma noticia esdrúxula de jornal – a poesia, encanta; a noticia, é mais uma entre tantas, está ali para vender, informar e pronto, é descartável. A poesia, não, ela fica, permanece, vai com a gente para  o túmulo sendo uma companheira de nossas sensações mais inesquecíveis. 
Tudo pareceu muito simples naquela manhã de outono, mas, eram tempos que o simples tinha enorme valor para mim. 

Quando eu me fui, deixando sorrisos, agradecimentos e encômios, rezei para que tivesse deixado algo de bom nas lembranças de todos aqueles personagens que passaram na minha vida e ficaram incrustados como uma pedra na grande rocha de minhas reminiscências, pois que, da maior parte deles, levei algo que sempre busquei e buscaria depois: a gentileza do servir e o sorriso da chegada. 
  

6 comentários:

Anônimo disse...

Que texto lindo Gilbertomeuzinho!
bjs.

Maria das Graças disse...

Como é bom observar a beleza simples da vida. É o que encanta e nos alimenta seja um bolo de milho,a pamonha,o pátio da Igreja ou as pessoas no seu eterno ir e vir.
E assim caminha a humanidade.

Um abraço afetuoso.

Cris França disse...

resumos das coisas mais belas da vida, que só existem a o olhos atentos, lindo! bjs

Denise disse...

"Nada é mais real....de a maneira simples de viver"
Há de se ter olhos de sentir,assim como você
Lindo!

Valéria lima disse...

Que lindo texto. Temos apenas uma chance para causar uma boa impressão.

BeijooO'

Gorete . SoLua disse...

Vivemos correndo e nem sempre "degustamos" as coisas simples da vida, e até esquecemos de sorrir. E um sorriso diz tantas palavras...
Belo texto

Doce beijo :)