quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O bebê

E não é que o sujeito despertou pela manhã, bem cedinho, nove horas da madrugada e ao seu lado, estava deitado tranqüilo e sorridente, um bebê.... Um bebê.... Ao seu lado, naquele quarto escuro, situado no décimo oitavo andar do Edifício Kafka. Tentou entender a situação. Todas as janelas trancadas, as portas hermeticamente fechadas. Ninguém em casa, afinal, como devia de ser, morava sozinho já há alguns anos. Como aquele bebe fora parar ali, em sua cama. Procurou em sua roupinha alguma pista, e nada encontrou, nem roupa, nem pista. Que pista, afinal? O guri, repentinamente, como se houvessem ligado um botão, abriu a boca no mundo e começou a chorar. Ele cochichou no ouvido do petiz, pediu calma. Pareceu piorar. Pegou um resto de batata frita que restava em um pacote encima do criado mudo (desejou que o criado não fosse mudo para lhe aconselhar alguma coisa! Para que servem criados mudos?) e ofereceu ao nenê. Nada. Não quis. O choro aumentou de volume. Ligou uma música. Tocou, Raimundos. O garoto chorou mais alto. Axé music. Mais alto. Pagode. Mais alto. Soltou fank music, e piorou de vez o “choreiro”. Desligou o rádio, percebeu que o bebê além de chato, tinha péssimo gosto musical. Pegou um copo de água, e estendeu frente ao guri. Ele não o pegou. Desajeitadamente, pegou o bebê e tentou enfiar o liquido goela abaixo. Viu que não gostou. Não recriminou-o, pensou. Água para mim, considerou, só em último caso.
Pegou o nenê no colo, ele parou de chorar tal qual tinha começado. Envaideceu-se. Seu colo era mesmo irresistível, confessou com seus botões. As meninas adoram, jactou-se. Não sabia o nome do guri, resolveu chama-lo de K. Isto em homenagem a primeira palavra que lhe veio na cabeça quando o viu pela manhã.
K sorria-lhe. Ele próprio estava mal-humorado. O que fazer com aquele pedaço de gente em seu apartamento. E logo hoje que iria com uma turma para uma boca livre. De onde você veio, perguntava-se sem encontrar nenhuma resposta convincente e que não lhe parecesse maluca.
Em um momento, pensou ser chacota dos amigos. Mas ninguém tinha a chave de seu apartamento e o zelador, já havia ligado para ele, disse que não havia emprestado a chave dele para ninguém. Não era habito dele. Descartada esta hipótese, achou-se num desses programas tolos de televisão que fazem câmera escondida e babaquices do gênero. Tirou um sorriso bonito da cartola, penteou o cabelo e esperou a entrada do apresentador. Meia hora depois, desistiu desta suposição, chateado pela perca da notoriedade súbita e acidental.
Improvisou uma mamadeira com uns instrumentos quaisquer que é melhor não mencionar e deu leite de vaca para a criança que, sem entender, tinha aparecido um litro na geladeira. Nem sabia que leite de vaca era branco, sempre achava que era verde, por causa do pasto. Enfim...Nem ligou.... depois de aparecer um bebe do nada, leite de vaca era algo irrisório perto deste mistério.
Deitou-se novamente com o guri ao seu lado que, por seu lado, pequeno lado, já ressonava pesado, como se fora gente grande. Enraivecido e assustado em meio a esta situação estapafúrdia, acabou adormecendo, dizendo que assim que acordasse, iria entregar o guri ao Conselho Tutelar. Eles que resolvessem a parada.
Dormiu a tarde inteira, a noite inteira.
Acordou no dia seguinte, assustado. O bebê. O bebê. Olhou para onde o havia deixado. Nada. Somente o vazio. Correu os olhos pelo quarto, andou pelo apartamento, abriu a porta, ganhou o corredor, nada... nada do guri.... sumiu!!! Ligou para o Zelador. Perguntou do bebê. Ele disse que não sabia nada de bebe e ainda recomendou que parasse de beber. Andava com perguntas e jeito estranho. O bebê? O bebê? Onde estava o bebê? Quis ficar feliz... não conseguiu..... Flagrou-se com uma lágrima correndo pelo canto dos olhos. Chorava com saudades do bebê. Do bebê... Mas que bebê? De quem era o bebê? Não sabia. Chorava com saudades do bebê.....

Um comentário:

Regina disse...

Olá, meu doce amigo!

Singelo e bem humorado texto!

Concordo com o gosto musical do "seu bebê"!!! Aliás, com o péssimo gosto musical, como você se referiu!...

Mas que lindo bebê seria este, que conseguiu conquistar e verter lágrimas deste sensível poeta?!

Um bebê muito especial, com certeza!!...


Muito feliz por suas visitas diárias! Muitíssimo obrigada pelo privilégio de ter sua luz e seu brilho lá no meu cantinho!!

Estou bem, começando o ano a correr atrás de meus desejos (ou pelo menos, tentando) e o primeiro deles, estudar!...

Mas sempre reservando um tempo para este meu querido amigo!!

Beijos no coração!!