terça-feira, 22 de maio de 2007

Domingo à tarde, quase noite, momento maior de introspecção. Por que será que nestas horas a gente se volta para dentro de nós próprios e fica procurando respostas....Que benesses estas respostas darão para nossas vidas? São tantos os questionamentos que sinto é melhor sair para dar uma volta, sem destinos ou bússolas, uma viagem de idas com voltas sem maiores comprometimentos que senão fugir....Nossa própria cabeça, vez em quando, pode ser um animal selvagem que não sabemos domá-la....Devo pensar nisso depois, aprender a domar meus instintos, meus pensamentos.
Viro a quadra de casa e adentro a avenida, lá na frente vejo um volume atirado à sarjeta. Aproximo-me, os olhos refletindo curiosidade. É um homem, Deus é um homem. Não falemos em Deus nestas horas, ele não tem nada com isso. Está deitado, decúbito dorsal, todo o corpo na sarjeta e uma perna encima da calçada. Seus olhos estão fixos no céu, olho para o céu e não está azul, parece que tudo no mundo nesta quase noite de domingo está negro. Seus olhos estão abertos, mas ele não vê nada, percebo isso. Ele está inconsciente, adormecido profundamente, as moscas voando ao seu redor como atalaias de seu sono. O sujeito bebeu até desmaiar. Penso em quais animais ele tenta domar, que feras habitam sua cabeça que o obriga a entorpecê-los com álcool. A pena – compaixão – pode ser um sentimento terrível e é o que sinto por aquele homem, jogado ao desprezo de uma sarjeta. Ele foi vencido pelos seus tormentos, seus pensamentos foram mais fortes que sua vontade. A derrota, me parece, pode ter diferentes níveis. Há o nível em que se perde com honra, esta é a melhor derrota; há o patamar em que a derrota não deixa honra, contudo, fica a possibilidade de se recuperá-la, depois, num momento mais fortuito; e há esse tipo de derrota, que joga o homem na sarjeta da calçada, da vida, reduzindo-o apenas a um volume na avenida. Segui meu caminho, tenho meus próprios animais selvagens para domar e a constrangedora cena em nada me ajudou, pior, fez ajuntar mais algumas bestas àquelas que já me atormentavam. Tenho um pensamento essencialmente judaico acerca a bebida alcoólica (deve ser porque a detesto!). Aos suicidas não resta sequer o direito de ser enterrado junto com os demais da congregação. Parece ser impiedoso, mas é a verdade. Detesto a bebida e, sobretudo, os seus efeitos. Em como ela consegue transformar homens em meros volumes....estranhos volumes às sarjetas de nossas cidades.
Chego a Avenida principal de Fátima do Sul e ela, à noite, é um misto de desolação e congestionamento. Alguns points que chamam a atenção dos jovens ficam lotados deles, os carros vomitando som alto e de pouca qualidade, hoje em dia é mesmo assim, compensasse com potência o pouco que se tem para mostrar: na música, nas pessoas; as gurias desfilando como caça à frente dos rapazes; estes em bandos, a abrirem suas caldas como se pavões fossem, todas as armas de conquista engatilhadas para chamar a atenção das fêmeas. Os amores ganham novos contornos nos dias de hoje, lascivos e mundanos, penso que não fui feito para esta época e seus modernismos.
Caminho pela parte desolada da urbe, no domingo à noite a solidão combina mais com meu espírito introspectivo. Um outro bêbado encostado a um poste fala comigo em uma língua ininteligível. Dou uma resposta educada, sigo em frente, o passeio não me ajudou muito. Parece que todos os bêbados estão soltos na noite fatimassulense. Retorno para casa, e tomo Clarice Lispector nas mãos, domo todos meus animais selvagens lendo “A hora da estrela”. Quais pensamentos teriam assolado Clarice num domingo à noite qualquer...será que os gênios sofrem como nós mortais comuns? Sem perceber adormeço, adormecendo comigo todos os meus questionamentos. Talvez a única resposta que realmente exista é que não nos é permitido ter respostas porque a vida perderia o sentido se já tudo soubéssemos...nós não saberíamos conviver com todas as verdades que habitam neste universo e em suas dimensões. E, no silêncio do quarto, sonhando com poetas e poemas aprendo a domar meus pensamentos....e durmo, mais uma vez inocente dos pensamentos que me acusam.

Nenhum comentário: