Atendia a uma senhora quando o primeiro deles
entrou.
Era um atendimento enfastiado, cansado mesmo.
A senhora fazia questão
de todas as coisas em suas minúcias desnecessárias muito bem explicadas.
Eu pego o cartão sempre assim... Eu sempre trago uns
trocadinhos...Todos os meses venho aqui... Onde posso pagar a fatura???
O atendente dava
respostas monossilábicas, olhar desatento, modos distraídos, tudo nele ausente dali.
Não reclamemos, ele não
era de modo algum grosseiro com ela, a impressão que dava era que acreditava o
trabalho grande demais pelo dracma de um real que a senhora deixaria depositado
em seu cofre. Só isso.
Foi nesse instante que o
primeiro deles entrou...
A senhora já idosa saia
com sua fatura nas mãos e a missão nas pernas de ir ao banco quitar seu boleto.
O primeiro deles
solicitou sua necessidade colocando no inicio da frase a chave universal para
todos os bons atendimentos: Por gentileza!
O atendente ficou
espantado, mas não acusou o golpe, era daqueles tipos que não demonstram seus
assombros desnecessariamente. Por gentileza, pensou o comerciante, são como
elefantes desfilando na rua principal, se vê um agora e outro... sabe Deus
quando.
E o cliente, o primeiro
deles, fez seus apelos sempre com palavras amáveis e elegantes encaixados em
frases bem construídas – por favor, muito obrigado, perdoe-me tudo isso rotina
em seus lábios.
Foi quando o segundo
deles entrou...
Trazia uma face de
sexta-feira nebulosa de agosto e já ao entrar apresentou seu cartão de visitas:
Ontem, a empresa tal me ligou oferecendo
uma promoção e aquela filha disso, filha daquilo... Não contente com isso despejou
um rosário de xingamentos que não conseguiríamos reproduzir por não conhecê-los
e pela correção que um escritor sempre deve ter com seu leitor. Algumas informações
são supérfluas.
O atendente calou-se,
resignado. Dedicou-se ao término dos
trabalhos solicitados pelo primeiro deles.
O segundo deles,
sentou-se, enfurecido, num puff personalizado com a logo da corporação odiada,
blasfemando contra a atendente, a empresa e a vida.
Findado as atividades, o
primeiro deles pagou e agradeceu. Ao sair, cumprimentou o segundo deles que
respondeu com um amargo: Humpf!!!
Voltou-se para o
atendente e deu um ultimo sorriso que foi com uma mensagem cifrada: Boa sorte,
amigo!
Saiu e para o atendente,
parece que o sol saiu com ele.
Olhou para o segundo
deles que partiu em sua direção como se o vendedor agitasse um pano vermelho à
frente de um touro.
Sentiu saudades do
primeiro deles.
Sentiu saudades da
senhora que passava no outro lado da rua comemorando a fatura quitada.
Armou-se de paciência e
atirou-se no olho do furacão.
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