terça-feira, 25 de março de 2008

QUANDO A MORTE CHEGA...


Encostado ao balcão bebia e fumava. Tossiu longamente.
Ao seu lado, alguns amigos que se entretinham em preencher o tempo de vazio. Uma música distante e triste entupia o ambiente de melancolia.
Olhou para a porta do bar e a viu, seu olhar cravado no seu, vestindo um excitante vestido negro, os cabelos negros e lisos escorrendo em cascata pela bela cabeça e banhando os seus dois ombros nus.
Ela era linda, como havia de ser. Sentiu-se aliviado por vê-la definitivamente, por vê-la tão bela e tão gentil para com ele. Os outros também a viram, num primeiro momento, sentiram um frio na espinha, depois, cativaram-se talvez pela beleza dela, talvez pelo seu sorriso frio e enigmático, talvez por esta estranha vontade que as vezes todos nós sentimos de abandonar tudo e simplesmente descansar, fugir para o desconhecido à procura de um porto seguro.
Ele avançou para ela, e ela o recepcionou num abraço longo e demorado, não havia lágrimas, não havia tristeza, seu carinho abrandava todos os sofrimentos – tossiu num lenço branco e ele se manchou de vermelho. Ela passou a mão em seus cabelos, sorriu para ele, deu-lhe o seu braço que passou sob o seu, e saíram para a rua, abandonando o bar e seus visitantes aos seus pensamentos e meditações mais diversas possíveis. O silêncio oleoso grudava nas pessoas e nas coisas e não queria mais se soltar.
Um dos homens num ímpeto, correu para a calçada, chegou à frente do amigo e da visitante. Olhou-a profundamente, estendeu sua mão para ela, como se a convidasse para levá-lo também na jornada. Ás vezes, a dor que sentimos é tão grande, o vazio que levamos no peito é tão profundo que nos sentimos pequenos diante de nossos problemas e somente atos desesperados e insensatos surgem para se solidarizar conosco. A rotina e o cotidiano estão de tal forma mergulhados numa mesmice mesquinha que torna nossa vida descartável para a felicidade, para as possibilidades que somente o futuro oferece. A moça de negro não era o futuro, ela era a curva final de toda existência, era o ponto final da história de toda a humanidade. Mesmo assim, mesmo sabendo disso, o homem também queria abraçá-la.
O amigo o impediu. Não se traduzia sua atitude num ato de beligerância. Ele simplesmente sabia que o destino marca suas horas, e a do amigo, ainda não havia chegado.
Então se viraram e ganharam a rua. Lado a lado, unidos por seus braços, determinadamente subindo a rua. Ela toda linda em seu caminhar, e ele ao seu lado, esvaziado de si mesmo. Sumiram da vista do amigo na calçada e de toda a existência na curva descendente da ladeira que se formou à frente de ambos, não antes de todos ouvirem, pela ultima vez, sua tosse longa e forte... Um bizarro jeito de dizer adeus!
O sol já nascia e os homens pediram uma ultima bebida no balcão, todos eles entretidos com a vida, mergulhados numa rede de pensamentos sobre sua existência.
A vida são incertezas, pensaram todos, mas a morte, ah! A morte é a primeira certeza entre todas...

Nenhum comentário: