terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

ELOGIO ÀS MARMITAS


Não existe utensílio mais nobre do que a marmita.
Ela confere ao seu portador a melhor dignidade.
Trabalhadores usam marmitas.
Sem querer dizer que, quem não usa marmita não é trabalhador.
A questão é que ela é um símbolo, um totem de sacrifício humano em produzir e construir.
Além disso existe outra questão, para mim mais importante, raramente marmitas são preparadas pela mesma pessoa que a irá usar, quem faz esse afazer é sempre outro, outro que derrama durante esse trabalho todo um sentimento  de alguém que cuida e ama; de alguém que se preocupa com o próximo; marmitas também são sinônimos de amor e solidariedade.
A maioria das pessoas vê marmitas com desdém.
Não conseguem enxergar nela o seu real valor. Não percebem que ela está sempre em seu lugar desconfortável, longe dos lugares nobres da cozinha e quando convocada apresenta-se para o trabalho sempre com o mais branco sorriso. Marmitas não têm preguiça, nem reclamam de nada, elas amam servir ao seu senhor e faz disso uma vocação despejando o melhor de si.
Marmitas sabem que, depois de tudo, depois que forem usadas muitas vezes com piadas humilhantes sobre elas, seu destino será retornar para o mesmo limbo, um universo onde habita o esquecimento.
Elas não se importam com isso, aprenderam a viver com o pouco que possuem esses raros momentos de protagonismo onde seu senhor desfila com elas de mãos dadas pelas ruas, praças, avenidas e empresas da cidade. Nessa hora elas são felizes, se sentem importantes.
Oh, marmitas! O que todos nós temos feito a vocês?
Eu não tenho nada melhor para lhes oferecer, como vocês sou pequeno e frágil, mas ainda que tudo isso seja pouco, lhes dou o meu reconhecimento pelo seu valor e nobreza.
Voces são singulares e poderosas, queridas marmitas! Saibam disso! Não deixem ninguém lhes convencer do contrário, o contrário é mentira.
E entre todas vocês, existe uma que especialmente cumprimento. E esta história aconteceu muito tempo atrás e me foi contada pelo meu amor mais lindo. Amor que também usa marmitas. Amo vocês marmitas, vocês cuidam do meu amor.
Esta era uma marmita pertencente a uma criança do campo, que assim como sua marmita também era nobre, digna, valorosa, trabalhadora, e, ainda assim, era humilhada diariamente pelos orgulhosos (tolos!) que acreditavam que a gordura saturada da cantina da escola lhes premiava ostentação e superioridade.
Um dia, esse grupo de tolos orgulhosos jogou a marmita dessa criança no chão e todos viram a comida se espalhando pelo frio chão da escola enquanto que a marmita rolava estrondosamente escadaria abaixo.
As lagrimas de vergonha da criança misturaram-se as lagrimas de escárnio dos ricos debochados.
O quadro pintado parecia de Salvador Dali.
De um lado, a marmita humilhada; do outro, os lanches de cantina exaltados.
Isso não é para mim, não quero conhecer esse mundo.
Mundo que prefere os indiferentes e frios lanches de cantina ao calor sentimental de uma marmita.
Sei e somente sei que precisamos de mais marmitas.
As pessoas necessitam delas, urgente.
Quanto a criança, ela sobreviveu, lembrem-se que tinha gente que enchia sua marmita todos os dias e essa mesma gente a protegeu e a amou, e ela cresceu,  se tornou um pai de família, foi produtivo para a sociedade e se tornou um servo do Senhor.
Os tolos orgulhosos??? Ah! Esses outros eram apenas lanches de cantina, desses que se compram em qualquer lugar...

Nenhum comentário: