De tudo o que me lembro esse tudo me deixa em êxtase.
A cidade era pequena, de ruas poeirentas, molecada na rua, carroças e cavalos subindo pela avenida transportando gente e carga. O velho cinema ficava numa rua transversal à avenida. De tudo o que me lembro, lembro que esse cinema sempre foi velho. Para mim, ele era um elemento da natureza, houvera nascido junto com o mundo, antes mesmo da pequena cidade. Para mim e o restante dos guris o velho cinema exercia sobre nossa imaginação um fascínio indescritível. Era o palácio onde residia a magia, a aventura, a alegria. Sonhávamos todos com as canções de cinema, aquelas músicas italianas para lá de românticas que nos preparava os espíritos para a sessão que viria. E, como relatar o lento apagar das luzes, as emoções que pulavam dos nossos peitos e eram extravasadas pelas nossas gargantas em grandes e largos gritos de “Vivas!” “Vivas!” “Vivas!”, e dê-lhe assovios, olhos arregalados, braços erguidos, pipocas para o alto. Quando finalmente as luzes se apagavam por completo, o silêncio reinava no velho cinema, todos queriam ver os gols do Canal 100 e se extasiarem com os trailers nas novas epopéias que encheriam nossos corações de ação nas semanas seguintes.
Não havia muita escolha, geralmente era um bang-bang, Trinity, Giuliano Gemma em um faroeste espaguete italiano; víamos muito Tarzan, era o preferido da gurizada e também Mazzaropi, este sempre era campeão nas bilheterias; na sexta-feira santa, entrava ano e saia ano víamos “A Paixão de Cristo” e o piso do cinema ficava escorregadio com as lágrimas das beatas e da gurizada.
Outro grande barato era ficar durante a semana vendo os pôsteres dos filmes que seriam passados nas sessões noturnas. Vinha o grande pôster no centro, e, ao lado, pequenos fragmentos do filme; através destes estilhaços em retratos branco e preto a gente imaginava a estória toda e passávamos horas discutindo sobre mocinhos e bandidos.
De tudo o que me lembro esse tudo me deixa em êxtase... E me faz sentir uma saudade danada do velho cinema, dos tempos em que as famílias iam de mãos dadas para dentro desses palácios da sétima arte ver a telona juntos e depois, saírem para bater papo nas praças ou tomar alguma coisa no boteco da esquina.
Pelo que sei, o velho cinema ainda resiste em pé, lá na pequena cidade, ainda que acabado, não funciona mais como cinema e, provavelmente, está aposentado para toda e qualquer coisa. Mas eu o levo comigo, no coração, e para mim, nunca haverá outro como ele – cadeiras desconfortáveis, acústica sofrível, pipoca fria, um calor de dar inveja a uma fornalha, mas foi diante de todas essas adversidades que aprendi a amar a sétima arte e ela ajudou-me a construir como sou.
De tudo o que lembro me leva a lembrar com maior tristeza: tenho saudades do velho cinema...
(*) Dedicada ao velho cinema de Paraná d’Oeste/PR, na foto.
Como é bom recordar bons momentos não é mesmo?!
ResponderExcluirBjs.
Fez nos viajar contigo pelo bons tempos e reviver algumas memórias de cinema que para mim são inesquecível como a eterna musica do Canal 100. Parabéns pelo tema, paixão que temos em comum. abraços mon ami!
ResponderExcluirE quantos velhos cinemas há por aí que somente estão nas lembranças. Não importa como ele era.
ResponderExcluirEra o palácio onde residia a magia, a aventura, a alegria. :)
Doces beijos