domingo, 25 de abril de 2010

ESTRATO DE DIÁLOGO NO SOLÁRIO

Andaram...

Os amigos conversavam sob o manso sol do outono, sem maiores preocupações, sem complicações, lado a lado, caminhando sem rumo pelo solário da cadeia, esticando as pernas.

Iam...
 Um deles falou de amor, que um dia ele o visitou e o aprisionou dentro de seu abraço enlouquecedor. Disse que por amor, matava e morria, arrancando do outro um sorriso mais bizarro que esta confissão maldita.

Vinham...
O outro respondeu que não conheceu o amor. Amor para ele resumia-se a alguns minutos encima do catre, com a mulher de pernas abertas, e bem abertas de preferência. Arrancou do outro uma gargalhada escandalosa, ainda mais escandalosa que sua confissão maldita.

Iam...
O primeiro sublinhou que o amor realmente existe e que, enquanto amou, se sentiu melhor como gente. Tanto que, no dia que o amor o abandonou, não conseguiu viver sem ele e o matou... Com um certeiro tiro na testa. O outro, sorriu, exaltando a forma rápida como o amigo resolvia seus dilemas.

Vinham...
O segundo sublinhou que não acreditava nesta história. Nunca houvera visto o amor, nem de mãe, nem de pai, nem de irmão, de amigo, ou de mulher. Mulher para ele, quando queria, pagava e pronto. Simples assim... Esta história de amor era uma grande besteira, disse, ele não perdia seu tempo com essas cretinices de fracos. O outro sorriu, exaltando a forma simplória com a qual o amigo não criava quaisquer dilemas.

Pararam...

Sob o sol de outono, de alguma forma a conversa de ambos os tocaram e ficaram ali, absortos de todas as coisas ao seu redor, lado a lado, olhando para os grandes muros, para as grades do solário, sem enxergar este horizonte, seus olhares transcendendo. O primeiro lembrou-se do rosto com que o amor lhe tocou a vida, um dia... O segundo, sonhou com um rosto qualquer, desejando que o amor também o visitasse... Voltaram a caminhar pelo solário, uma caminhada curta na distância, longa no desejo de liberdade e de amar...


OBS:
SOLÁRIO: Solário é o espaço, não muito grande, destinado ao banho de sol dos internos (presos), dentro de uma cadeia ou penitenciária.

3 comentários:

  1. tem a sonoridade das baladas

    balada do amor descrente

    beijos mon ami

    ResponderExcluir
  2. É, os brutos também amam...

    Linda crônica, Gilberto! Ela me fez pensar em tantas coisas, como: a violência infantil, os desafetos, os desamores, a solidão, a educação...

    Brilhante como sempre, Gilberto!

    Beijos e uma boa semana!

    ResponderExcluir
  3. ...Sem a menor intençaõ de plagia-la ( ODEIO PLAGIO!!) mas realmente o que a Cris falou é exatamente o que pensei...parece uma balada...
    Linda cronica.
    Me fez pensar...
    bjossssssss

    ResponderExcluir

No meio do caminho,
existem diversas coisas importantes...

... Tua passagem por aqui, me encanta, me anima!

No meio do caminho, tua visita, é uma dessas coisas importantes!

Grato pela tua atenção e paciência!
Que Deus derrame sobre tí bençãos sem medida!